EM TEMPOS DE BNCC,
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE O ENSINO DE ANTIGUIDADE CLÁSSICA NO BRASIL
Claudia Beltrão da Rosa
Et
quae tanta fuit Romam tibi causa uidendi?
Libertas,
quae sera tamen respexit inertem, candidior postquam tondenti barba cadebat, respexit
tamen et longo post tempore venit...
[-
E qual o motivo de visitares Roma?
-
A Liberdade, que, mesmo tardia,
Lançou
sobre mim, então inerte,
Quando
eu já tinha a barba branca,
Seus
olhos favoráveis, e chegou, muito
tempo
depois...]
(Verg. Ecl. 1, 25-28)
Em
artigo publicado na Revista Helade (2001),
o classicista Pedro Paulo Funari, argumentando pela importância de uma
abordagem crítica em História Antiga nos livros didáticos, relembra a defesa do
estudo do latim e do grego feita por Antonio Gramsci, no Quaderno 12, pois as línguas estruturam a vida social dos povos,
condicionam a cultura e os conceitos que orientam e enquadram as nossas vidas
e, no caso das duas línguas mencionadas, o grego e o latim, há um aspecto ainda
mais premente: boa parte, senão a maior parte, dos conceitos ocidentais
modernos implicam apropriações e ressemantizações de conceitos, noções e
palavras oriundas do grego e/ou do latim, em um processo cuja estruturação é
demonstrada por Reinhart Koselleck, em seus estudos sobre a contemporaneidade
do não-contemporâneo (2006). Funari relembra que os clássicos nos dão aquilo
que nenhuma tecnologia moderna, nenhum manual moderno, nenhuma facilidade da
era digital permite: o conhecimento de muitos dos nossos fundamentos.
Quando
pensamos em nosso mundo, o mundo contemporâneo, deparamo-nos com elementos e
ideais que têm suas origens nos clássicos. As instituições estatais estão
plenas de nomes derivados – mesmo que seu sentido tenha sido alterado – de
instituições antigas, sem que o “senado” seja nem a primeira nem a única. Não
apenas na nomenclatura das instituições políticas, mas também nos jornais
diários e em nossa vida quotidiana, vemos que mulheres e homens aspiram,
promovem, celebram, defendem, matam e morrem por termos e conceitos de origem
clássica, especialmente gregos e romanos. Um país, por exemplo, só é
reconhecido como “civilizado” pelos media e, consequentemente, pelo senso
comum, se vive de acordo com aquilo que se chama “democracia”. Por isso, faço
eco a Mary Beard e a John Henderson, e afirmo:
O estudo dos clássicos
nunca é uma autópsia, por mais que se considerem “mortas” as línguas e as
culturas que as utilizaram. A cultura ocidental apoia-se a tal ponto em séculos
de investigação do legado clássico que esse legado está sempre arraigado em
algum lugar em tudo o que dizemos, vemos e pensamos (BEARD, HENDERSON, 1997:
150).
Mesmo
no nível mais quotidiano, é difícil escapar dos clássicos. Desde as colunas que
adornam as fachadas dos bancos, dos edifícios públicos e dos condomínios
residenciais que se pretendem luxuosos aos filmes hollywoodianos, o clássico
faz parte do tecido da nossa modernidade diária. Palavras derivadas de termos
gregos e latinos povoam nossa fala quotidiana. Nosso próprio idioma, o
português, é uma língua derivada do latim, e nossas palavras têm uma ligação
intrínseca não apenas com a língua latina propriamente dita, mas também com as
diversas apropriações e ressignificações, ao longo dos séculos, de experiências
coletivas antigas que se tornaram modelares para a tradição ocidental. Os
clássicos, então, estão ao nosso redor e em nosso interior, tenhamos consciência
disso ou não. O problema é que assistimos a um movimento decidido a esquecer
tanto do passado clássico quanto do passado mais recente, e que sofre de
amnésia voluntária. Assim, boa parte das bases da nossa cultura poderá ser,
muito em breve, simplesmente extirpada do nosso sistema de educação com óbvios
prejuízos para a compreensão das principais questões da vida moderna e de nós
mesmos.
Identidades
se sobrepõem e interagem em cada um de nós e há diferentes maneiras de narrar a
história. E como, em toda conferência, o conferencista pretende fazer algo com
a sua plateia, pretendo hinc et nunc,
algo mais preciso do que um simples lembrete genérico de que os clássicos são
importantes para o nosso autoconhecimento e que sua eliminação do currículo tem
um potencial nefasto para a educação escolar das novas gerações: pretendo fazer
com que os meus leitores assumam uma posição em relação à história, em todos os
seus amplos sentidos. Acima de tudo, para que saibamos de onde viemos. A
história faz de nós o que nós somos. Se não a conhecemos, não temos consciência
de nós mesmos, temos pouca capacidade reflexiva (tão em falta atualmente) e
sucumbimos a toda a amnésia cultural da contemporaneidade. Conhecer nossos
fundamentos constitui uma necessidade, portanto, se queremos entender a nossa
vida. Sem isso, nada pode existir além de uma frágil e volátil compreensão das
questões relevantes da nossa própria vida, e sucumbimos facilmente a todos os
modismos, clichés, preconceitos, justamente pela impossibilidade de reflexão. O
“eu” atual não pode ser rigorosamente apreciado se não levamos em conta seus
alicerces, sua formação por meio de ideias e imagens herdadas. A História
Antiga, e a Antiguidade clássica em particular, então, não pertencem a um
passado remoto sem ligações com o Brasil.
Vejamos
alguns exemplos nos quais o ideal e o modelo da Grécia e de Roma irrompem como
significativos para a compreensão da modernidade. A arte do Romantismo não pode
ser separada do helenismo de seus escritores e artistas. A prática educativa e
a teoria que formaram as mentes dos dirigentes europeus, norte-americanos e
brasileiros até pouco tempo atrás, assim como as figuras de destaque da vida
pública, estavam totalmente comprometidas com os clássicos. O grego e o latim
forneceram, durante milênios, o “pano de fundo” das mentes ocidentais. A
Revolução Francesa e os Estados Unidos da América fizeram de Roma o ideal
republicano, e utilizaram a política clássica como uma maneira de conceber os
princípios de governo e as práticas sociais. A Alemanha dos séculos XIX e XX
encontrou uma identidade cultural na arte e na literatura – e seu fervor
nacionalista – em uma Grécia imaginada, dentre outros exemplos possíveis. E a
busca pelas origens clássicas e o poder dos mitos gregos e romanos continuam a
conformar e/ou distorcer a vida política ocidental. Grécia e Roma irrompem
recorrentemente como ideais significativos, como verdadeiras bandeiras para
diversos movimentos e reformas, inspirando mudanças políticas e artísticas.
Uma
Grécia e uma Roma imaginárias têm sido miragens com grande potencial criativo
em momentos cruciais da história política e cultural do Ocidente. As figuras
mais radicais da política, da arte, da música, da poesia, do pensamento e do
comportamento se apropriaram, ao longo dos séculos modernos, dos clássicos como
força inspiradora ou entraves a combater, mas é difícil que isso seja
mencionado abertamente, sem o lugar-comum de que representam um tema elitista e
conservador, ou de que é destinado a uns poucos, ou de que têm pouca relevância
para a atualidade brasileira. Esses clichés denotam uma visão bastante estreita
da relevância dos clássicos, decorrente, no mais das vezes, de um
desconhecimento dos mesmos e de uma grave deficiência educacional, hoje muito
comum, inclusive, entre os professores de história. Ao contrário, o descuido em
relação ao estudo da Antiguidade clássica – e o seu consequente conhecimento de
segunda, terceira ou quarta mão através dos mass
media –, aprofunda o fosso entre a formação cultural das “elites” e dos
mortais “comuns”, aprofundamento para o qual a proposta da BNCC-História
contribuirá significativamente. O mundo clássico, tão próximo e tão distante de
nós, como bem mostraram Mary Beard e John Henderson em Antiguidade Clássica, uma brevíssima introdução, dependendo do modo
pelo qual é apresentado, pode servir tanto como inspirador da luta pela
liberdade e pela igualdade, como pode surgir como justificativa do status quo patriarcal e opressivo. Uma
apreciação adequada e consciente do passado requer uma reflexão sobre as
narrativas, imagens e mitos, sobre as maneiras de contar histórias e sobre as
análises que dão sentido ao passado – e, por conseguinte, ao presente.
No
Brasil, contudo, vivemos uma situação curiosa no que tange ao ensino de
História. Os “critérios de relevância” são ídolos contemporâneos das Diretrizes
Curriculares Nacionais e dos idealizadores e defensores da BNCC-História.
Decerto, todo ensino e toda pesquisa devem ser relevantes para as nossas vidas,
mas a relevância não deve significar o que vem significando na prática atual,
ou seja, o deleitar-se com os eventos do momento e reagir somente a narrativas
e imagens exatamente semelhantes às nossas. Um dos maiores critérios de
relevância deveria ser o de compreender e apreender a diferença do passado e
sua contínua ação no presente. É relevante compreender como gerações anteriores
conceberam o passado, como foram por ele inspiradas e estimuladas, como se
rebelaram contra ele, como o rejeitaram. Os clássicos têm sido constantemente
reinventados e ressemantizados como modelos e, em consequência, seu estudo é
uma força positiva para compreender o presente. Se não soubermos como a
Antiguidade clássica povoou a imaginação, estimulou e estruturou o pensamento e
agiu como uma bandeira da opressão, mas também da revolução artística, social e
política, a visão que temos da nossa tradição cultural será necessariamente
limitada e distorcida.
Há
algum tempo, o significado político do ensino dos clássicos vem paulatinamente
se tornando tema de debates, e destaco o Grupo de Trabalho de História Antiga
(GTHA) da Associação Nacional de História (ANPUH), em seus diversos encontros
nacionais e regionais. Por um lado, como sabemos, textos clássicos sempre foram
um componente central da agenda educacional de correntes conservadoras; para
estas correntes, estes textos constituem reservatórios permanentes e imutáveis
de “verdades eternas” sobre a “natureza humana”, uma condição humana fixa, com
uma mensagem clara sobre limites severos à possibilidade de ação humana no
mundo e sobre as convenções políticas e sociais. Por outro lado, movimentos
contemporâneos de grupos (modernamente) subordinados como as mulheres, os
negros, os homossexuais e outros, trouxeram questões sérias e legítimas sobre
os elementos misóginos, racistas, homofóbicos e eurocêntricos veiculados pelo
ensino tradicional dos clássicos na modernidade. De fato, os clássicos,
dependendo de como são apresentados, podem ou não ser apoios sólidos para a
perpetuação de uma tradição monolítica ocidental, numa abordagem não crítica.
É
especialmente difícil para os professores verem suas atitudes pedagógicas e
científicas como dependentes de implicações políticas, mas não há ensino nem
pesquisa sem vínculo com uma ideologia. A questão maior é a de se estamos
conscientes do significado de suas abordagens e perspectivas. A maior utilidade
dos clássicos, nesse caso, está em seu ecletismo, em suas múltiplas origens e
características. A diversidade cultural dos antigos pode e deve ser apresentada
em contraposição aos discursos reacionários e conservadores modernos, no mau
sentido do termo, e servem como uma oposição à opressão da “tradição”
estiolante do status quo. O estudo
dos clássicos surge também, então, como elo constante de ligação da realidade
atual com as suas (modernas) origens ideológicas. A compreensão de nossas
crenças, costumes e instituições exige um recuo ao mundo antigo, sem o qual a
compreensão do presente será, no máximo, superficial.
***
Em
1995, a helenista brasileira Neyde Theml prefaciou o primeiro número da Revista
Phoînix e definiu o preconceito, até hoje presente no meio acadêmico, de que
era impossível pesquisar história antiga no Brasil, com uma pérola de ironia: Nas escolas brasileiras, aprende-se que Adão
foi o primeiro homem e o segundo, Cabral (frase retomada em THEML,
BUSTAMANTE, 2005: 9). De fato, o “pequeno” lapso temporal entre “Adão e Cabral”
era (e ainda o é, na BNCC-História) praticamente negligenciado pela ignorância
e a consequente incompreensão do valor dos estudos nesta área do conhecimento.
E podemos listar vários equívocos: o de acreditar que os estudos de Antiguidade
dizem respeito a sociedades mortas, a partir de documentos fragmentários, daí
sua não importância e seu caráter duvidoso; a crença de que idade antiga no Brasil é índio (frase
que ouvi de uma notória docente, titular de História do Brasil da UFRJ, nos
idos de 1987, dita, aliás, com desprezo tanto em relação à antiguidade como aos
indígenas sul-americanos); e o maior dos equívocos: não perceber a atualidade,
a modernidade e a pertinência dos estudos da Antiguidade, a partir do diálogo
entre os antigos e os modernos. Mais de duas décadas depois, a Revista Phoînix, e.g., é uma das publicações
científicas brasileiras consolidadas e consagradas na área de História Antiga,
demonstrando a cada edição que o estudo das sociedades antigas nos leva a
refletir com mais propriedade sobre as implicações e os embates da nossa
cultura e a esclarecer o que somos, comparados e confrontados com os “outros”,
os antigos.
No
âmbito universitário brasileiro, porém, mesmo com o grande crescimento da área,
ainda são poucas as instituições que contam com pessoal qualificado para o
ensino e a pesquisa da História Antiga. No ensino básico, a falta de
especialistas é ainda mais grave. No mais das vezes, vemos as disciplinas e
atividades ligadas à área conduzidas por pessoas que não têm formação adequada,
o que leva a inúmeros desvios de formação dos egressos desses cursos e à
consequente incompetência dos docentes de História do ensino básico em suas
aulas de História Antiga. Professores mal formados têm uma grave diminuição de
sua capacidade crítica, especialmente porque, como bem sabemos, a maioria dos
docentes em atividade não prossegue a sua formação por meio de cursos de
pós-graduação ou mesmo de atualização profissional em sua área de conhecimento.
Apesar
de nos últimos trinta anos o ensino e a pesquisa de História Antiga serem muito
promissores, com investigações divulgadas em fóruns e publicações nacionais e
internacionais, bem como houve a consolidação de linhas de pesquisa em cursos
de pós-graduação voltadas para questões tais como: consciência histórica,
currículo, tempo histórico e educação, novas linguagens do ensino de História,
livro didático, material escolar, identidades culturais, memória e ensino de
História, dentre outros, no Brasil, a sub-área da História mais prejudicada na
educação básica é, inquestionavelmente, a famosa “História Antiga e Medieval”
(conjunção altamente discutível, uma exclusividade nacional derivada da falsa
crença de que o “mundo” começou com Cabral). A proposta da BNCC-História revela
tal falácia com clareza.
Como
resultado direto dessa falta de formação adequada por parte dos egressos dos
cursos, constata-se que os conteúdos referentes à História Antiga e à História
Medieval são os que padecem da maior quantidade de problemas, alguns dos quais
extremamente graves, o que pode ser verificado em qualquer análise preliminar
dos livros didáticos de História. Na já citada Revista Hélade (2001), Gilvan Ventura da Silva fez uma série de
considerações sobre o livro didático que, a despeito de mais de uma década ter
passado, continuam atuais, mostrando que, para além de erros crassos e dos
anacronismos (pecado mortal do historiador), os volumes que se referem aos
conteúdos de “História Antiga e Medieval” padecem da terrível mania das simplificações. Decerto, é
preciso levar (ou traduzir) conteúdos complexos aos alunos, adequando-os ao seu
nível cognitivo e à sua faixa etária e, de preferência, aprimorando paulatinamente
tal nível. Ser capaz disto é a marca suprema do bom professor. Mas o que vemos
nos livros didáticos e nos programas de ensino (mesmo no nível superior) é algo
grosseiro e pernicioso. Suprimem-se detalhes e características particulares e,
na pretensão de facilitar o processo de ensino-aprendizagem, tratam-se os
conteúdos com tal negligência que estes são distorcidos, falsificados. Gilvan
Ventura detectou e analisou, no artigo citado, cinco tipos de simplificações,
as processuais (que, no afã de resumir
os processos históricos, produzem caricaturas das diversas sociedades), as teórico-conceituais (talvez mais graves,
pois a regra primeira da História é a reflexão prévia dos termos e conceitos
que serão utilizados na narrativa; os conceitos nos livros didáticos de
História Antiga, invariavelmente aparecem como se fossem autoexplicativos, ou a
definição dada é tão genérica que os diluem e acabam por não dizerem nada), as comparativas (os livros didáticos são
recheados de comparações estapafúrdias), as valorativas
(levando os alunos e leitores a julgamentos de caráter ético ou moral sobre
eventos e personagens históricos, produzindo estereótipos, criando ou
reafirmando preconceitos) e as generalizações
espaço-temporais (quando se dá a características particulares de uma
sociedade, ou região, ou grupo social, uma abrangência e duração que não são
verificadas na documentação).
É
certo que temos uma necessidade, talvez inata ao ser humano, de buscar uma
unidade básica entre as sociedades humanas, mas, para mim, o potencial
criativo, num encontro com a Antiguidade clássica é, primeiro e acima de tudo,
a possibilidade de engajamento com o “outro” cultural. Não que inexistam
continuidades e semelhanças passíveis de estudo, pelo contrário, mas cremos que
uma das nossas responsabilidades é pôr em discussão a crença, da maioria dos
estudantes, de que nada há de diferente daquilo que conhecem que possa ser
sustentado ou que seja desejável. A experiência cultural de nossos estudantes é
profundamente a-histórica, e muitas
vezes anti-histórica, e isto é algo
que determina suas crenças, ideias e suas percepções da vida individual e
coletiva. Às vezes, me perguntando por que a maioria dos estudantes e, mais
grave, estudantes de História, acreditam tão tranquilamente que aquilo que
temos hoje, padrões, convenções, coisas justas e coisas injustas são imutáveis,
e é tão anacrônica no trato com os temas e sociedades que estuda, penso que tal
aquiescência revela, infelizmente, o fracasso da escola e o sucesso de nossas
mídias culturais em convencê-los de que as mensagens transmitidas e seus
parâmetros são ditados por uma natureza humana imutável. Lamentavelmente, as
propostas da BNCC-História reiteram e reafirmam a aparência de imutabilidade da
vida em sociedade. É claro que chamar esta postura de a-histórica ou
anti-histórica implica uma concepção de História como o reino das
possibilidades, na qual as escolhas sociais levam a determinadas condições de
possibilidade em cada contexto social e histórico particular. Um encontro com um
mundo diferente pode fazer com que vejamos – se apresentamos este mundo não
como um repositório das “melhores” ou das “piores” escolhas, mas sim como um
modelo de totalidade social nas quais as consequências de escolhas de vários
tipos, econômicas, sociais, políticas, religiosas, culturais, educacionais, são
determinantes –, que podemos nos contrapor à falsa crença da “necessidade
natural” das coisas serem como são.
Reiteramos
constantemente que nossas leituras do passado têm seu fundamento num diálogo
entre passado e presente. Nossas tentativas de compreensão do passado dependem
das questões que surgem a partir do nosso enquadramento cultural. Ao mesmo
tempo, procuramos descobrir as questões que o próprio passado tentava
responder, em seu tempo e lugar, em nosso diálogo com a história. Nossa
perspectiva presente sempre envolve uma relação primordial com o passado, mas
ao mesmo tempo, o passado só pode ser compreendido em termos da limitada
perspectiva do presente. Desta forma, creio que a tarefa de alcançar uma
compreensão do passado é possível, mas, em uma perspectiva hermenêutica, tal
compreensão jamais pode separar o conhecedor do objeto do conhecimento. Não
podemos fazer nossas “incursões” pelo passado sem levar o presente conosco,
além de todas as nossas expectativas de futuro. Nesse sentido, toda compreensão
é uma construção criativa, pois uma obra ou um tema passam de um contexto
cultural a outros, e novos sentidos vão sendo incorporados a eles, sentidos que
jamais poderiam ser antecipados por seu autor, ou por outros leitores e
audiências. Desta forma, os novos leitores/espectadores do passado fazem
conexões, eliminam ou saltam barreiras, criam sentidos com base no seu
conhecimento tácito do mundo em geral, e das convenções literárias, artísticas,
sociais, políticas, etc., em particular. Uma leitura de um livro e a visão de
uma obra do passado, seja de que tipo for, é sempre um convite à construção de
novos sentidos para o presente.
Os
estudantes, porém, têm muita dificuldade de operar este diálogo quando o ensino
é completamente divorciado dos mecanismos com o quais lidam em sua experiência
quotidiana. Daí a importância, por exemplo, das discussões sobre a chamada
“cultura popular” no ensino dos clássicos. Não se trata aqui de buscar um nível
de relevância que simplesmente confirme suas percepções correntes do que é
importante. Em diferentes grupos de estudantes, e em diferentes contextos, esta
percepção varia, dependendo de diversos fatores, como os fatores
socioeconômicos, o tipo de música que ouvem, os divertimentos de todo tipo,
jogos, gírias, televisão, redes sociais, cinema, tudo isso tendo um papel
decisivo na formação da autopercepção, das suas opções de vida e de seus
valores morais. A incorporação de tais elementos nos cursos de história permite
levar os estudantes a uma interrogação simultânea de suas próprias práticas
culturais e as de sociedades com práticas sociais distintas, pois trazidos à
vida, por exemplo, nos jogos, palcos e telas, mitos, personagens e cenas da
Antiguidade ressoam através da vida quotidiana de milhões de brasileiros, e
fazem os clássicos se endereçarem ao nosso presente, criando novas imagens e
mitos sobre a Antiguidade (e sobre nós mesmos), renovando os debates sobre a
natureza da tradição clássica, as definições da História e o lugar do passado
em nosso mundo.
Sugestões de leituras e
vídeo
Além
de recomendar, obviamente, a leitura da proposta da BNCC-História, considero
fundamental a leitura das diversas manifestações ocorridas pró e contra tal
proposta. Uma consulta à página eletrônica da Associação Nacional de
História-Seção Rio de Janeiro (ANPUH-RJ) facilita o acesso a boa parte delas:
E
excelentes considerações sobre nossas relações com os “antigos” e os usos do
passado podem ser encontradas na entrevista dada pelo Prof. Fábio Faversani
para o Programa Com Ciência
(TV-UFOP):
Referências
bibliográficas
BEARD,
M.; HENDERSON, J. Antiguidade Clássica:
uma brevíssima introdução. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1997.
FUNARI,
P.P.A. A importância de uma abordagem crítica da História Antiga nos livros
escolares. Hélade, Número Especial/Série Antiga, 2001:25-29: www.helade.uff.br
KOSELLECK,
R. Futuro Passado. Contribuição à semântica
dos tempos históricos. RJ: Editora PUC-Rio, 2006.
SILVA,
G.V. Simplificações e Livro Didático: um estudo a partir dos conteúdos de
História Antiga. Hélade, Número
Especial/Série Antiga,, 2001:19-24: www.helade.uff.br
TEHML,
N; BUSTAMANTE, R. M. Editorial. Phoînix
10, Rio de Janeiro, 2005: 9.
Cara Prof. Cláudia,
ResponderExcluirObrigado por sua explanação objetiva e consciente. Eu gostaria de perguntar: em sua visão, qual o fundamento para a retirada dos conteúdos de História Antiga do BNCC?
Prof. André Bueno
Boa tarde! Obrigada por sua pergunta, que não tem uma resposta simples (mas, o que existe de realmente simples?).
ExcluirA meu ver, uma compreensão mais ampla da exclusão de História Antiga, História Medieval e outras várias exclusões da BNCC pede a observação cuidadosa dos fundamentos e dos objetivos da equipe responsável por sua redação. Com o intuito genérico de criar um currículo não "eurocêntrico" e geral para as escolas brasileiras - o que é bastante razoável, pois nem sequer a historiografia europeia é hoje eurocêntrica -, a equipe pecou por criar um currículo mais eurocêntrico que nunca, além de bastante desatualizado em relação à produção do conhecimento histórico realizada no Brasil.
Por que digo que a BNCC é eurocêntrica e desatualizada? Há muito o que dizer sobre isso, mas é preciso sintetizar as ideias, assim, minha tentativa de resposta é apenas uma síntese: porque mesmo os conteúdos de História do Brasil giram em torno de um "Estado-nação" aos moldes da historiografia do século XIX e de "ciclos econômicos" que foram problematizados nas décadas de 1950 e 1960 e superados, criando um currículo no qual interessam apenas alguns elementos imediatamente anteriores à "conquista" portuguesa (a BNCC fala em "conquista", e seu vocabulário é muito discutível), tanto no que tange ao atual território brasileiro quanto em relação a uma "África" cujas configurações são muito redutoras. Observe, na BNCC, como povos indígenas do território brasileiro são nomeados... sempre no passado e depois praticamente desaparecem da vista (o que pode levar as novas gerações a reiterar uma imagem de que povos indígenas são uma realidade passada). Do mesmo modo, povos africanos surgem no palco da BNCC no contexto da escravidão moderna (com uma breve pincelada de alguns povos anteriores a Cabral, mas o texto os define em moldes mais eurocêntricos do que qualquer escola europeia conseguiria fazer, ou seja, como "reinos" e configurações estatais no modelo europeu moderno). Veja como outros povos do território americano aparecem na BNCC: são nomeados apenas grandes confederações (uma ideia europeia do século XIX)... Em suma, a base lembra bastante algumas obras do IHGB no século XIX: tudo converge para o Estado-nação e é interessante só e somente só se permite a criação de "nexos" com o Estado-nação. Há problemas conceituais na BNCC gravíssimos, dentre outros problemas, inclusive, a desconsideração de avanços curriculares recentes (observe que não há indícios de preocupação com questões de gênero e outras questões trazidas, e.g., por importantes movimentos sociais e culturais).
Ao observar as ideias e modelos que sustentam a BNCC, dá para entender os motivos que levaram à censura de vários povos (gregos, romanos, judeus, egípcios, etíopes, povos sul-americanos e outros tantos) que não se organizavam ou não se organizam com base no "Estado-nação".
A meu ver, portanto, esta proposta da BNCC não é apenas ultrapassada em termos historiográficos; ela é muito retrógrada e conservadora também.
Grande abraço,
Claudia Beltrão
Prezada Prof. Cláudia,
ResponderExcluirBom dia! Gostaria de destacar um trecho de sua conferência: "Como resultado direto dessa falta de formação adequada por parte dos egressos dos cursos, constata-se que os conteúdos referentes à História Antiga e à História Medieval são os que padecem da maior quantidade de problemas, alguns dos quais extremamente graves, o que pode ser verificado em qualquer análise preliminar dos livros didáticos de História".
Neste sentido, pergunto: como solucionarmos o problema da formação docente e do próprio conteúdo exposto pelo livro didático no campos da História Antiga, visto que ainda enfrentamos problemas parecidos em relação à História da África e indígena, mesmo depois das leis 10.639 e 11.645?
Desde já, agradeço a disponibilidade e congratulo pela excelente reflexão.
Atenciosamente,
Plínio Ferreira Guimarães
IFES campus Ibatiba
Boa noite, Plínio,
ExcluirVocê tocou em duas das maiores dificuldades no ensino de História: a formação docente e os materiais didáticos, e não há uma pedra filosofal para resolvê-las. Antes de tudo, importa levantar as questões e problematizá-las. De fato, a despeito das leis, os materiais didáticos para o ensino de História da África e da História Indígena(e as rubricas generalizantes são sempre complicadas...) são em geral simplificadores e, muitas vezes, têm o potencial de gerar grandes equívocos (e reiterar preconceitos).
Há pouco tempo atrás, em uma das Jornadas promovidas pela ANPUH-Rio, uma palestrante africana começou sua intervenção perguntando: "História da África... mas, que África é essa?". E o que queremos dizer quando dizemos "História Indígena"? A questão também vale para "História Antiga" (o que significa "antigo" neste nome?).
Tentarei ser um pouco mais objetiva agora: a meu ver, os cursos de graduação em História deveriam concentrar-se menos em "transmitir conteúdos" aos graduandos, e mais em "ensinar a pesquisar, a construir o conhecimento, a buscar saber". Se há uma característica geral do conhecimento histórico é que ele é sempre provisório, discutível e superável, e isso desde os "antigos" gregos. Se tenho sempre que reiterar com meus alunos de graduação que observem de quem é a autoria de um livro/artigo e quando foi escrito, imagine o cuidado que se tem de ter com os materiais didáticos preparados para as escolas básicas, que costumam ter uma defasagem em relação à produção acadêmica de alguns anos (em alguns casos, algumas décadas)? Acrescente-se a isso a mania das simplificações, que Gilvan Ventura tão bem tratou no artigo citado na minha intervenção.
Some-se a este quadro as limitações dos corpos docentes das universidades - se hoje em dia há muito mais docentes antiquistas do que há vinte anos, ainda são poucos e, mesmo assim, são humanos e não dão conta de tudo - pois o modelo de ensino universitário brasileiro ainda é "aulista/conteudista", com raras exceções. No que tange à História da África e à Indígena, são especialidades recentes no Brasil, por isso, é compreensível que haja (ainda) pouco material disponível e que as dificuldades sejam imensas.
Em suma, levantar questões, ser crítica em relação aos conteúdos de materiais didáticos, observar com cuidado as minhas turmas e experiências diversas de ensino, e experimentar aquilo que me pareceu ser consistente e eficiente, tem sido o meu caminho no que tange ao ensino.
Se você puder, leia o dossiê da Revista Hélade (eu citei dois artigos deste dossiê na minha intervenção, mas há outros muito interessantes).
Um abraço,
Claudia Beltrão.
Lendo sua comunicação me veio a memória o período que estava na graduação na Universidade Estadual do Piauí, onde o contato com a História Antiga e Medieval foi curto e com professores não especializados na temática, isso claramente influenciou na minha formação, tive um colega de turma que no primeiro momento tentou pesquisar uma temática relacionada a História Medieval e por falta de profissionais sua ideia foi negada, tendo ele que enveredar por outra temática de pesquisa, se levarmos em consideração grandes centros no caso São Paulo, local onde estudo no momento, vejo que essas dificuldades que presenciei na graduação provavelmente não aconteceriam, você não acha que de certa forma a concentração de pesquisadores relacionado com a História Antiga e Medieval em determinados centros, como Rio, São Paulo, Maranhão(esse recente), faz com que seja de certa forma uma abertura para propostas como as do Ministério da Educação, impostas nos últimos meses?
ResponderExcluiratt.
Gustavo Moura
Boa noite, Gustavo,
ExcluirSim, é possível, e esta situação é resultado de escolhas também. A historiografia de base eurocêntrica-nacionalista do século XIX (e a BNCC tem muitos pontos em comum com essa historiografia) entronizou a ideia e a prática de que aos grandes centros (supostamente com vocação "internacional") caberia o estudo do que era considerado "história nacional" e "história geral", enquanto as demais localidades (supostamente com "vocação regional") deveriam se dedicar ao estudo da "história regional", que, de fato, acabou se restringindo a uma história "local". Obviamente, ideias que hoje consideramos preconceituosas sobre a capacidade de estudiosos de "não-grandes centros" de produzirem conhecimento histórico estão na base desta lógica. Você citou o Maranhão como exemplo e, sim, o pessoal do Maranhão tem demonstrado como é possível fazer pesquisa de ponta além do local (sem desmerecer o local, obviamente, mas o conhecimento não deve se pautar por restrições geográficas, e se eu sou carioca não tenho que olhar apenas para o Rio, assim como o estudante do Piauí não tem que mutilar seus interesses porque mora no Piauí), assim como ocorre em Goiás, Rio Grande do Norte e outros lugares nos quais há a presença ativa de pesquisadores e professores de diversas especialidades.
Como eu disse, a história faz de nós o que nós somos, e este desequilíbrio ainda existente no "mapa" do conhecimento produzido no Brasil é resultado de escolhas que foram feitas antes de nós, mas que não significam um dado natural. Em suma, há muita gente boa se esforçando para que existam espaços e oportunidades para que os estudantes possam desenvolver seus interesses de estudo, sem censuras acadêmicas e aqueles tradicionais "não pode".
Um abraço,
Claudia Beltrão.
Olá, Prof. Cláudia. Minha dúvida é em relação a divisão da nova proposta. Dividida em 60% ensino nacional, comum; e 40% ensino regional. Gostaria de saber se dentro desses 40% há a possibilidade de se trabalhar história antiga e medieval ou se é obrigatório na proposta que seja trabalhado a história regional. Esse valor pode ser moldado de acordo com o professor/instituição ou deve ser de acordo como está previsto? Outra questão é em relação ao ensino superior. Caso a proposta seja colocada em prática, como se dará o ensino nas universidades? Existe alguma proposta para elas também?
ResponderExcluirDesde já agradeço.
att.
Lucas Eduardo de Oliveira
Universidade Estadual de Ponta Grossa - PR
Boa tarde, professora Cláudia! A dúvida de Lucas também é minha. Como de fato devo me posicionar em minha escola frente a esta organização da BNCC?
ExcluirExiste uma pressão por parte das Secretarias de Educaçao para que os professores se posicionem e façam contribuições à Base... mas tenho receio se sei realmente se a proposta é boa ou não..
Daniela Maria Weber
Olá, Lucas e Daniela,
ExcluirResponderei a vocês dois, ok?
A minha resposta começará com uma pergunta: vocês conhecem algum(a) professor(a) de história que tenha conseguido a façanha de ministrar (de fato) todo o conteúdo previsto para um ano escolar? Se conhecem, saibam que é um ser raríssimo. E não se trata apenas de ritmo de turmas... Meu filho é professor de história do ensino básico, e em muitos dias simplesmente não consegue dar aulas, porque a escola dispensou os estudantes por causa de tiroteios na comunidade. Isso acontece também com meus orientandos e minhas orientandas. A meu ver, esses 60% serão, na prática, 100%. Outro "porém": os materiais didáticos serão, ao que tudo indica, também nacionais, e seguirão os tais 60%. E os exames previstos também serão nacionais, ou seja, eis os 60% novamente.
Sem contar com os óbvios prejuízos na autonomia docente (a "antiga" regência de turma, que permitia ao docente decidir o que era melhor, mais recomendado ou possível para cada turma), tudo isso me levar a crer que os supostos 40% de "escolha regional" serão impraticáveis.
Será que esses 60% de história "nacional" atende às necessidades das diversas regiões e comunidades brasileiras? Vocês já leram a BNCC? Será que (sem levar em conta as deficiências conceituais da BNCC) esses 60% são suficientes, por exemplo, para as populações diversas da fronteira sul brasileira?
Lucas, sobre a formação dos professores nas universidades, já há uma proposta de novas diretrizes que apontam para uma espécie de "professor generalista" de "Humanidades". Com os materiais padronizados, exames nacionais padronizados, ensino padronizado, então, mesmo que eu esteja sendo agora bastante pessimista agora, quem precisará de professores especialistas? Quem precisará, de fato, de "docentes" nas escolas? Espero que eu esteja totalmente enganada, mas é possível que tenhamos algo como "monitores" ou "tutores" generalistas que - e usarei um termo que hoje em dia é aplicado aqui e ali a professores do ensino básico - "facilitarão" o aprendizado de conteúdos pasteurizados, que serão, então, cobrados em exames nacionais. Os cursos de licenciatura passarão por grandes mudanças (que já assomam em um horizonte muito próximo), e a formação do historiador conseguirá realizar o "milagre da reversão do tempo" (categoria, aliás, praticamente ausente na BNCC). Se na década de 2000 foram publicadas diretrizes nacionais que promoviam a união entre o "historiador" e o "professor de história", ou seja, reforçavam a ideia do "tripé": ensino-pesquisa-extensão, o novo modelo - que ainda pode ser alterado - separa novamente o professor do ensino básico do historiador. Talvez isso leve à existência de (poucos) cursos de bacharelado em História, para formar historiadores, e haverá cursos de formação de professores nos novos moldes.
Abraços,
Claudia.
Boa tarde, profe Claudia!
ExcluirTraduz nas tuas palavras, minhas angústias! Como trabalhar os 60% (que é a BNCC) em um ano letivo... e como de fato, nós professores, poderemos nos manifestar? Se órgãos como a ANPUH nao foram chamados oficialmente para a construção da Base, haverá mesmo consideração para as propostas enviadas pelas escolas, via site?
Daniela M. Weber
Professora de História
Estrela-RS
Prezada professora, junto-me aos colegas para, além de agradecer pelo texto claro e pertinente, deixar uma interrogação sobre o problema da formação docente. Que mudanças nos cursos de Licenciatura a senhora considera que produziriam um impacto sobre a problemática aqui apontada? Desde já, grato.
ResponderExcluirMarcio Nicolau
UNIRIO
Boa noite, Marcio Nicolau,
ExcluirCreio que eu respondi, de um modo ou de outro, à sua pergunta ao escrever para o Lucas e a Daniela. O maior problema em relação aos cursos de formação de professores (incluindo professores de história) é o novo modelo de tipo "generalista", e o resultado tende a ser uma separação entre historiadores (produtores do conhecimento e coisa e tal) e professores de "Humanidades" (incuindo história), que "aplicarão conteúdos dos materiais nacionais e facilitarão (sic.) o aprendizado". Espero estar enganada, mas é para isso que apontam as novíssimas diretrizes.
Um abraço,
Claudia Beltrão.
Bom dia,
Excluirsim, professora, respondido. Não só a resposta dada aos participantes Lucas e Daniela contempla o meu questionamento. Também o trecho em resposta ao participante Plínio, que destaco a seguir: "os cursos de graduação em História deveriam concentrar-se menos em 'transmitir conteúdos' aos graduandos, e mais em 'ensinar a pesquisar, a construir o conhecimento, a buscar saber'". Estou plenamente de acordo com essa fala, bem como concordo com a senhora que a dicotomia historiador X professor é falsa, o professor é um pesquisador, a meu ver. Quanto à BNCC, li o documento e também as críticas da ANPUH-Rio. Não sei se me equivoco, mas um grande problema da BNCC foi a sua formulação precipitada, sem o necessário tempo para debate e reflexão. Eu me pergunto se a chamada "consulta pública posterior" (ainda em curso, pelo que vi) impactará, de fato, o documento final. Temo que as "reformulações" propostas, a partir de críticas pontuais, não sejam suficientes, haja vista que a "base" apresenta, como exposto, fragilidades conceituais e ausências várias.
Sigamos debatendo!
Abraço,
Marcio Nicolau.
Me chamou muito a atenção este trecho: "A história faz de nós o que nós somos. Se não a conhecemos, não temos consciência de nós mesmos, temos pouca capacidade reflexiva (tão em falta atualmente) e sucumbimos a toda a amnésia cultural da contemporaneidade. Conhecer nossos fundamentos constitui uma necessidade, portanto, se queremos entender a nossa vida." Como pedagoga procuro sempre refletir sobre a existência humana, seu significado e objetivo. Nossa "amnésia cultural" é muito grande e já esta trazendo danos irreparáveis para as gerações presentes e futuras. Pergunto: Como reverter esta inconsciência, se é que posso chamar assim, a alienação pela qual o Brasil esta passando?
ResponderExcluirMEDIAÇÃO INFORMA: FAVOR ASSINAR A POSTAGEM COM NOME COMPLETO.
ExcluirOBRIGADO.
Boa noite, Neuli,
Excluirsua intervenção toca em um tema muito complexo, e não tenho como respondê-lo, a não ser com algumas ponderações: a "amnésia cultural" de que falo não é restrita a brasileiros, longe disso. É internacional, infelizmente. E quando eu falo em nossos fundamentos, não estou fazendo uma simples defesa do ensino de história antiga. Falo de um modo de vida no qual o presente é o que importa, e o imediatismo impera. É claro que se pode viver assim, apenas no presente, mas, historiadoras(es) são seres para quem nossas palavras, objetos, crenças, instituições, costumes etc. são criações humanas no tempo e no espaço, gerados, modificados, recriados ao longo do tempo e das experiências humanas. A história dessas experiências é algo que amplia os horizontes e permite o que, em latim, se chamava "libertas".
Abraços,
Claudia Beltrão.
Concordo com você e eu já esperava de meus colegas historiadores a defesa pela História Clássica que é fundamental na construção dos saberes históricos. Entretanto, como sempre vem à tona, durante décadas o currículo escolar omitiu nossas origens indígenas e africanas - senão a subordinou ao eurocentrismo tão combatido atualmente - em detrimento das histórias dominantes. Outrossim é um problema recorrente no ensino básico: a pouca carga horária destinada ao ensino de História. Portanto, de acordo com suas pesquisas, qual o melhor método para continuarmos (e melhorarmos) o ensino clássico com uma carga horária dividida com os novos temas?
ResponderExcluirEllan Eduardo
Boa noite,
ExcluirUm grande erro da BNCC, a meu ver, é retirar a Antiguidade Clássica por ser "europeia". Isso é simplesmente errado. E retirar conteúdos da história de povos europeus pelo simples motivo de serem europeus. Europeu não é o mesmo que eurocêntrico, longe disso. E conteúdos da história europeia (que é moderna, porque na antiguidade não não havia europeus) também fazem parte da nossa formação cultural e institucional; sem eles, o currículo se torna falsificador da realidade.
De fato, os currículos escolares brasileiros até algumas décadas não pareciam ser brasileiros, e já houve muitas mudanças bem-vindas. Vou dar um pequeno exemplo de uma discussão que costumo fazer em sala de aula sobre como era e é construída a "Antiguidade Clássica", dependendo dos interesses, disposições e motivações das diferentes épocas. Meu exemplo é sobre a documentação textual da tradição manuscrita. Textos antigos têm uma aparência imutável, e os estudantes geralmente os leem como se expressassem aquilo que seus autores antigos realmente escreveram. Mas, isso é só uma aparência, e um estudo simples dos modos de reconstituição dos manuscritos (que não são antigos) basta para sabermos que os filólogos têm de fazer escolhas, e toda escolha depende de uma base cultural e de crenças.
(continua)
Meu exemplo é uma passagem de uma das mais famosas obras da tragédia grega, o Édipo-rei, e basta pensar no mito criado por Freud, o famoso e moderno Complexo de Édipo, para imaginar o quanto esta tragédia fundamenta a compreensão atual da psiqué humana. Pois então, no século XVIII, a fim de reconstituir trechos corrompidos, em uma passagem crucial da peça na qual Édipo faz perguntas sobre como era Laio (que ele ainda não sabia ser o homem que matara), Édipo pergunta: "como era Laio?" e Jocasta responde: "Laio era grande". "Grande" é o termo que aparece nas traduções da peça em diversos idiomas atualmente, mas há um problema aqui. O filólogo, ao reconstruir uma falha justamente no qualificativo usado por Jocasta, exatamente uma letra faltante, interpretou a frase a meu modo. Usando letras latinas agora, o manuscrito dizia: "me.as". Cabia apenas uma letra no espaço corrompido, e o especialista escreveu "megas" ("grande"). Mas, seria isso mesmo?
ExcluirPois bem, Laio é um membro da família dos Labdácidas que são descendentes de Cassiopeia, filha de Fênix, filho de Cadmo, e rainha da Etiópia. E se o manuscrito dissesse "melas" (negro) e não "megas" (grande)? Como sustentação desta hipótese, há o fato de que ao longo da tragédia e em outras versões desse mito, Édipo é chamado de "obscuro", mas o termo grego tanto é traduzível por obscuro como por escuro. Laio era descendente de etíopes e, levando isso em consideração, seria mais óbvio completar o manuscrito como "melas", e não "megas", mas, será que o filólogo iluminista conseguiria imaginar um Laio negro, e não um Laio grande (afinal, reis são grandes, mesmo que sejam pequenos). Este é apenas um exemplo, dentre vários possíveis, que falam sobre escolhas, e que criaram uma "Antiguidade clássica" branca, quando, com base em pesquisas recentes, sabemos que a Antiguidade clássica era colorida e, por isso, o deus Poseidon era amigo e hóspede frequente dos etíopes e de outros povos que, hoje, chamamos "africanos" (um conceito e um nome romanos, aliás).
É sobre escolhas assim, que são determinadas pelo que acreditamos, que devemos refletir, pois de nada adianta propalar que a BNCC é "não-eurocêntrica" e, na prática, ela ser eurocêntrica. Creio que o potencial libertador para os estudantes negros, brancos, indígenas e outros é muito forte quando gregos e romanos banqueteiam com etíopes, e reis e rainhas de que falamos até hoje são tão "mestiços" e coloridos como nós. O Édipo-rei abre uma via para lidarmos, em sala de aula, com conteúdos de história africana, sem que nossos estudantes aprendam que africanos existem na história somente pela via da escravidão. Para tal, não é necessário ter muitas horas de aula, mas é preciso que o professor seja um pesquisador, não é?
Abraços,
Claudia.
Boa noite professora Claudia,
ResponderExcluirEm primeiro lugar, correndo o risco de ser repetitiva, gostaria de parabenizá-la pelo excelente texto. Quando vi o titulo logo imaginei se sua opinião seria semelhante à minha. Sim, é! destacando uma parte de seu texto, "Um dos maiores critérios de relevância deveria ser o de compreender e apreender a diferença do passado e sua contínua ação no presente. Se não soubermos como a Antiguidade clássica povoou a imaginação, estimulou e estruturou o pensamento e agiu como uma bandeira da opressão, mas também da revolução artística, social e política, a visão que temos da nossa tradição cultural será necessariamente limitada e distorcida". Gostaria de fazer minha ponderação e deixar um pergunta: De certa forma já é o que vem acontecendo. Percebo que muito de nossa história como sociedade vem se resumindo ás constantes lutas de classes e sociais. Sem que se perceba o quão importante é compreender os problemas pelos quais passamos na atualidade através de um olhar mais aprofundado na antiguidade. Como falar em democracia, em política feita pensando no povo, se a este povo é negado o conhecimento de suas origens como um todo? O discurso é o de fazer a história pelo olhar do conquistado e não do conquistador, mas penso: não foi o trabalho em conjunto, de ambos os lados que construiu a sociedade em que vivemos? Será que não seria repetir o mesmo erro do passado, tão problematizado e questionado, de se contar a história apenas sob o olhar do conquistador? Agora devemos contar apenas pelo olhar do conquistado! Porque não analisarmos e contar por ambos os olhares? Não seria muito mais rico e verossímil a história contada por ambos os lados. Junto aqui a minha pergunta chave: Tendo a oportunidade de iniciar nossos alunos do ensino básico nos estudos clássicos, como trabalhar tão grande conteúdo em tão pouco espaço de tempo?
Grata por ter a oportunidade de participar deste debate
Ana Paula Souza
UNESA
Olá, Ana Paula,
ResponderExcluirEu concordo plenamente contigo e, por ser uma classicista, percebo não dois lados, mas muitos lados e muitos olhares, bem como polifonias na criação da nossa base cultural. O saci pererê faz parte da nossa cultura tanto quanto o vampiro ou Hércules, e restringir a formação das novas gerações é mutilá-la.
Eu dei um exemplo na resposta anterior que talvez caiba aqui (o da peça Édipo-rei), bem como comentei as limitações de tempo, e as inevitáveis escolhas que temos de fazer. De fato, não se trata exatamente de uma questão de tempo, e sim de "modo". E o mais importante, a meu ver, é que o docente tenha a liberdade e o dever de escolher, segundo seu tempo, seu lugar e suas turmas, e não se limitar a reproduzir o que foi determinado em outras instâncias, o que é muito autoritário e redutor da prática docente.
Um grande abraço,
Claudia Beltrão.
Bom Dia Prof.Claudia!
ResponderExcluir-Como faríamos para abrir espaço para conhecimentos como História da América Latina ,África etc.Reconheço que abrir mão da cultura greco-romana é absurdo mas acho que está faltando diálogo ,não lhe parece?
-História é um ensino amplo e informativo e,portanto precisamos abrir espaço,talvez com aumento da carga horária,não seria um caminho?
Grato,Alfredo Coleraus Sommer
Prof. Cláudia Beltrão, boa tarde!
ResponderExcluirParabéns pelo belo texto, explanação consistente e muito clara!
No entanto, em "tempos de BNCC-História", gostaria que explicitasse um pouco mais a respeito da ausência ou dos silêncios dos conteúdos que englobam o período antigo, medieval e moderno no referido documento. Como ficará a cultura escolar nesse caso no que tange aos conteúdos, face a imensidão de publicações didáticas direcionadas ao público da educação básica? Costumeiramente, os manuais didáticos abrem os seus capítulos com os temas conectados a Europa antiga, medieval e moderna. E o que vimos nessa versão preliminar foi alguns excessos de marcos históricos da história do Brasil e um vazio a respeito dos conteúdos nos períodos aqui citados. No mais, como anda a finalização do documento - BNCC-História?
Mais uma vez, parabéns pelo texto!
Prof. Antônio Bezerra.
Cara prof. Cláudia,
ResponderExcluirMuito esclarecedor o seu texto. A formulação da BNCC da forma como foi feita só demonstra o preocupante divórcio entre as instâncias governamentais encarregadas de gerir a educação básica e os pesquisadores. Qual a causa deste distanciamento e desta dissonância nos discursos? Será que o governo, digo o MEC, tem se mostrado fechado à opinião dos pesquisadores, ou seria o contrário?
Jorge Luiz Ferreira Lima
Professor da Rede Publica do Estado do Ceará
Doutorando em História Social pela UFC
Acredito que não há conteúdo mais ou menos relevante para abordar em sala de aula aos nossos alunos e alunas e reconheço a influência Clássica em nossa sociedade atual. Porém, a disciplina de História tem tido sua carga horária diminuída, no caso do Estado do Paraná. Como abordar a Antiguidade clássica, o período medieval, o moderno, a contemporaneidade e ainda a história regional se no Ensino Médio do Paraná contamos com apenas duas aulas semanais?
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirProfessora. Excelente texto. Se possível me deixar um pouco do BNCC gostaria de perguntar: Como a senhora numa educação básica faria para ensinar a Antiguidade Clássica (Grécia, Roma), com demais civilizações antigas e africanas?
ResponderExcluirObrigado
Carlos Mizael dos Santos Silva
Olá, professora Cláudia,
ResponderExcluirComo disse Cícero, "o homem que não conhece a História é um menino" e parece que cada vez mais o aprendizado é deixado de lado e muitos continuam na situação ignorante de crianças por causa disso. Como vimos, o ensino de Antiguidade Clássica e Idade Média (sem contar o ensino sobre a história do Japão, China etc) é realizado de maneira muito superficial e cheia de equívocos. Sendo assim, como mudar essa atitude? Você tocou em dois pontos cruciais:
- Os livros didáticos: a maioria de seus autores não contém historiadores das áreas da História Antiga e Medieval. Não deveria isso ser mudado? Ou os próprios procurarem especialistas para consultarem sobre uma área a qual eles não dominam com confiança?
- A formação do professor: Talvez a principal tarefa do professor de Antiguidade ainda seja provar que é possível para os estudantes pesquisarem a fundo essa área e não cometer anacronismos e juízo de valores ao estudarem esses temas, o que acha disso?
- Uma opinião minha é que a publicação de livros (sejam gerais ou específicos) brasileiros sobre a Antiguidade Clássica é bem pequena comparada aos livros históricos sobre o Brasil, Idade Moderna e Contemporânea. Sei que atualmente o país possuí muitos historiadores antiquistas aptos para escrever, por exemplo, uma História da Roma Antiga, saindo dos estereótipos e generalizações que vemos por aí. Há uma falta de interesse proposital das editores em não querer esse tipo de produto? Sabe-se se a demanda por algo assim entre o público é baixa ou alta? A publicação de livros traduzidos ou escritos por historiadores brasileiros não seria uma maneira para divulgar a Antiguidade de maneira mais reflexiva?
Abraços,
Jhan Lima
Boa noite ,Dentre muitas mudanças no ensino de história, qual será a maior dificuldade do docente em sala de aula? Você acredita que a autonomia do professor possa abalar com essas mudanças?
ResponderExcluirBom dia professora Cláudia, no que tange a relevância do conhecimento histórico questiono; como conscientizar uma academia da relevância da História Antiga quando a mesma academia prioriza e enfatiza a importância de uma história do tempo presente, sem uma reflexão crítica acerca dos processos históricos?
ResponderExcluirBom dia professora Cláudia, no que tange a relevância do conhecimento histórico questiono; como conscientizar uma academia da relevância da História Antiga quando a mesma academia prioriza e enfatiza a importância de uma história do tempo presente, sem uma reflexão crítica acerca dos processos históricos?
ResponderExcluirAinda que o ensino de História clássica desapareça dos manuais curriculares, pode ou deve o professor, em suas aulas, fazer analogias ou citar eventos do mundo antigo para os alunos terem esse conhecimento? - João Gilberto Solano
ResponderExcluirOu ele deve seguir a risca o que for determinado pelas instituições reguladoras? - João Gilberto Solano
ResponderExcluirOlá,professora Cláudia!Realmente,é uma grande polêmica o que está ocorrendo com relação ao estudo da antiguidade e a proposta da BNCC. Isso já ocorre,pois,leciono história e,o livro do 6º ano não traz a Pérsia(Ásia).Bem verdade os europeus muito sacrificaram a América,porém,banir suas contribuições é certo?Como ficaremos se isso se consumar?Nos calaremos?
ResponderExcluirBom dia, professora!
ResponderExcluirTalvez meu esclarecimento venha pela resposta dada a colegas que já abordaram o tema: a restrição de tempo. Estive na última ANPUH Nacional, e presenciei a fala de pesquisadores ligados à História da América criticavam a maneira como esta área está colocada na proposta da Base, reforçando a ideia da distância entre o Brasil e as demais nações latinoamericanas... Ou seja, acho que a angústia é generalizada, por não darmos conta de todo o "conhecimento" que achamos relevante (enfatizando que não falo de conhecimento como sinônimo de conteúdo!)diante de um tempo muito curto destinado não só à disciplina de história, mas à área de humanas, de um modo geral... Como lidar com esta angústia e construir um currículo exequível???
Obrigada,
Gabriela C Beskow
Prof Claudia. ..olá!
ResponderExcluirEm sua opinião como deveria estar organizada à BNCC de forma a contemplar África e indígenas sem perdermos história antiga?
Como deveria ser essa reformulação? Quais conteúdos a senhora pensa que deveriam integrar essa nova base?
Grata....
Sandra Meira Santos
Prof Claudia. ..olá!
ResponderExcluirEm sua opinião como deveria estar organizada à BNCC de forma a contemplar África e indígenas sem perdermos história antiga?
Como deveria ser essa reformulação? Quais conteúdos a senhora pensa que deveriam integrar essa nova base?
Grata....
Sandra Meira Santos
Boa tarde, Cláudia
ResponderExcluirSeu texto reforça e sintetiza, de maneira bastante objetiva, grande parte dos debates em torno do ensino de História Antiga que sucederam a publicação da BNCC.
Penso que que a BNCC surtiu um efeito positivo entre nós, porque percebo que os pesquisadores de História Antiga e Medieval têm se articulado para repensar a relevância da Antiguidade e do Medievo na educação básica. Ágora nos sentimos mais responsáveis pela manutenção de conteúdos históricos indispensável à compreensão sobre como forjamos a sociedade em que vivemos.
Além disso, a ameaça de supressão de tais conteúdos têm contribuído para fortalecer, nas universidades, atividades voltadas à prática curricular.
São apenas percepções diante deste cenário que você mesma nos apresenta tão bem.
Parabéns.
Prof. Dr. José Petrúcio de Farias Júnior
UFPI/Picos
Boa noite,professora.
ResponderExcluirQue texto excelente e instrutivo,muito obrigado.
Sobre as mudanças,como modificar períodos históricos e acrescentar outros sem que aja uma conecçao entre esses períodos?
Acredita ser viável deixarmos a Historia Antiga e ensinarmos coerentemente os outros períodos históricos?
Seu aluno do primeiro ano de Historia,da cidade de Bauru-Sp.
Obrigado,
Wander Alexandre Araújo Miranda
Boa noite professora ! Gostaria de saber como a senhora ver o ensino de História atual no Brasil , mais precisamente no que se refere a formação docente, e qual sua opinião sobre a mudança no currículo minimo de História ?
ResponderExcluirOlá, prof. Cláudia,
ResponderExcluirgostaria de saber, nesse contexto de discussão sobre ensino de história e sobre o ensino brasileiro, o que a senhora acha dos cursos de História oferecidos à distância?
Ao mesmo tempo que facilitam o ingresso de muitos à vida acadêmica e democratiza o ensino, ele também abre as portas para uma formação menos sólida.
Ainda assim, considera-se válido sua permanência, se fosse essa a discussão?
Att,
Rosana Três Gazola
Boa noite, professora.
ResponderExcluirEm sua opinião como fazer para que os alunos, tenham uma participação ativa, com interesse real, nas aulas de História Antiga, mesmo com recursos e tempo limitados, isso é possível ?
Thereza Cristina Kling Bandeira.
Infelizmente, é verdade que o ensino da Idade Antiga e Média tem sido cada vez mais banalizados. Como já comentado em outra palestra daqui, existem jovens que, graças a uma mistura de toda essa "fantasiação" do mundo pré-Cabral com a ausência de um conhecimento prévio sobre o assunto, acreditam, por exemplo, que havia dragões na Idade Média.
ResponderExcluirNão digo que Antiguidade e Era Medieval são os períodos mais importantes da história, pois a história é algo linear e inseparável. Não se trata de fatos distintos, e sim de uma bola de neve que sempre segue. O que quero dizer é que essas duas épocas têm uma importância singular no que diz respeito à formação de opinião e compreensão de como funciona todas as bases do que temos hoje.
Mas afinal, é bastante conveniente criar uma sociedade sem noção das raízes e dos seus motivos. Uma sociedade que, tal como gado, apenas segue em frente e faz o que faz por costume não tem condições de opinar ou debater coerentemente. Não acho que essa banalização e distorção da Antiguidade e da Era Medieval sejam uma mera falta de planejamento ou uma má compreensão da sua importância. Muito pelo contrário.
Gabriella Meister Ortola
Bom dia, Cláudia Beltrão
ResponderExcluirMinha pergunta é sobre a noção de temporalidade na BNCC. Como você entende a noção de temporalidade da BNCC que substitui o modelo tradicional quadripartido por noções de “mundos” (mundos asiáticos, mundos africanos e afro-brasileiros, mundos europeus, mundos americanos)? Pensando a partir de teorias do currículo multicultural, a BNCC não reservaria aos “outros mundos” uma visão folclórica? Ou mesmo a-histórica ao só tratar/ inserir os “outros mundos” em relação à História do Brasil?
Ass.: Thaílla da Silva Sena
Boa tarde!Minha preocupação não é somente referente as disciplinas de história Antiga e Medieval,mas como este aluno ( do ensino fundamental)conceberá o que é política, ética, filosofia,sociologia, cidadania sem falar em arte.Como resolveremos isso no futuro?
ResponderExcluirOlá Professora Cláudia, maravilhoso texto e sua forma de abordagem sobre a "contemporaneidade dos antigos", realçando a importância do estudo dos clássicos para compreendermos o alicerce das estruturas sociais, políticas, culturais, entre outras que formam o que denominamos de Ocidente.
ResponderExcluirAinda não li o BNCC em si, apenas suas polêmicas, e fiquei chocado. No entanto, meu choque foi por um outro viés. Vivemos em um mundo globalizado, onde a interação entre pessoas de diferentes culturas em diferentes continentes é possível de ser feita instantaneamente pelas tecnologias de comunicação, um marco de uma nova era para a humanidade. Aqui reconheço então a necessidade de conhecermos a história humana, de toda e qualquer cultura possível do globo para darmos vozes a todos. Critico muito o fato de darmos pouca importância ao Oriente; Persas, Chineses, Indianos, Indonésios, regiões hoje com as maiores populações e economias, sem participação em nossa História ensinada das escolas ao ensino superior, em detrimento à uma visão ocidental da história. Lembro de um depoimento em um recurso audio-visual no Museu da Imigração em São Paulo, de uma coreana criticando o fato de para o ensino de história, na visão ocidental, a Coréia só "surgir" a partir da Guerra da Coréia. Como ficam os filhos desses imigrantes? Dos afrodescendentes, dos árabes, eslavos, asiáticos, até mesmo dos imigrantes de países vizinhos; nosso modelo simplesmente ignora a América Latina, como se não fossemos parte dela Só vemos a Guerra do Paraguai, com os paraguaios como "malditos invasores, bem que mereceram", e hoje os minimizamos à um país do tráfico.
Essa é minha utopia da história para o século XXI, de nos vermos como uma identidade global, humana e pluricultural, não sintetizando a humanidade à uma única cultura. Claro que por falta de pesquisadores em todas essas áreas, em todos os países, para formar essa identidade global cada país faz seu levantamento histórico para contribuir ao todo. Mas o que vejo é que esses modelos propostos que vêm e vão focam na formação de uma identidade nacional, nos heróis e eventos "importantes" para a formação desse Brasil, deixando o resto do globo à parte, como "O que importa é o Brasil, o resto é apenas interação".
Fico preocupado com essas visões nacionalistas num mundo já globalizado, vejamos o caso da União Européia, desmoronando por conta do ressurgimento de um nacionalismo em cada país: não sou mais europeu, sou inglês, sou francês, e por aí vai.
Enfim, minha(s) pergunta(s) seria(m): Você acha que ainda há sentido em debater entre contar a história pelo dominador, ou contar a história pelo dominado, ao invés de contar as relações entre eles? Por que ainda há o foco para um nacionalismo quando hoje as telecomunicações permitem nossa interação com outros além das fronteiras? Essa visão nacionalista, eurocêntrica ou não, não acaba minimizando quaisquer outras culturas, nos deixando orgulhosos de sermos brasileiros?
Caio Yuzo Dias Nobushige, Licenciando em História.
Boa tarde Cláudia!
ResponderExcluirDe que maneira devemos trabalhar as questões debatidas referentes a BNCC em relação aos conteúdos clássicos e a importância dos mesmo. De modo que o aluno possa ser inserido e instigado a se interessar pelo assunto?
Ass: Poliana Ferreira Honostório.
Boa noite a todas(os),
ResponderExcluirEm primeiro lugar, lamento que minhas limitações de tempo tenham impedido uma interação maior com vocês. Em segundo, eu agradeço pelas intervenções, que me trouxeram ideias e questões para reflexões futuras.
Em vez de tentar responder a cada uma das últimas intervenções, pois o tempo é curto, eu sugiro a leitura da manifestação pública da ANPUH-Nacional sobre a BNCC, publicada hoje, 11 de março de 2016, que pode ser lida através do endereço:
http://site.anpuh.org/index.php/2015-01-20-00-01-55/noticias2/noticias-destaque/item/3352-manifestacao-publica-da-anpuh-sobre-a-base-nacional-comum-curricular
Ressalto que o documento da ANPUH-Nacional não foi elaborado por meia dúzia de pessoas, de acordo com seus gostos pessoais ou suas idiossincrasias, mas é uma consolidação das contribuições de debates e análises promovidos pelas associações regionais em todo o país, incluindo os GTs e outras associações de docentes, pesquisadores e profissionais da área de História.
O debate sobre a BNCC não se encerra aqui. Longe disso, e a manifestação da ANPUH-Nacional é um momento importante. É importante que todo historiador, esteja ou não atuando em sala de aula neste momento, participe deste debate, pois a BNCC afetará a formação de milhões de pessoas no Brasil. O documento da ANPUH-Nacional, a meu ver, precisa de divulgação e pode instrumentalizar a discussão e a tomadas de posição por parte historiadoras(es), nas escolas, nas universidades, nos centros de pesquisa, nos centros culturais etc., pois trata-se de uma manifestação coletiva da nossa área.
Mais uma vez, obrigada pela atenção de vocês e até breve,
Claudia Beltrão
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO.