REPENSANDO A REPRESENTAÇÃO DE ESPARTA PARA A PESQUISA E O
ENSINO DE HISTÓRIA
Luis Filipe Bantim de Assumpção
A História é o produto dos questionamentos e demandas
do nosso tempo. Esta afirmação pode soar bastante equivocada para aqueles
indivíduos formados em um modelo tradicional de conhecimento historiográfico, no
qual o passado era compreendido como um dos sinônimos da História, que por ser
transmitido em uma instituição de ensino ou em livros “especializados”
tornava-se algo inquestionável.
Atualmente, em pleno século XXI, a ideia de uma “Historia Magistra Vitae” nos moldes de
Tucídides e Marco Túlio Cícero já foi superada e nós, historiadores, temos a
consciência de nossas limitações na produção do conhecimento histórico. Martha
Howell e Walter Prevenier destacaram que os profissionais da História idealizam
o passado em uma proporção muito maior do que o descobrem. Este apontamento não
é sem motivo, caso levemos em consideração que os historiadores selecionam os
eventos e as pessoas que deveriam constituir a sua “narrativa histórica”, bem
como aquilo que merece ser estudado pela importância central que exerce nos
interesses contemporâneos (HOWELL; PREVENIER, 2001: 01). Michel de Certeau
(2008: 16) clarifica esta premissa ao declarar que o pesquisador realiza uma
“triagem” para selecionar o que pode ser “compreendido” do passado e o que deve
ser esquecido. Ou seja, cabe ao historiador eleger aquilo que deverá se
constituir como História e o que deve ser preterido, tornando o seu ofício algo
de importância incomparável no interior de uma sociedade e na consolidação dos
mais variados interesses político-culturais.
De modo mais otimista, talvez, Marc Bloch
escreveu algo semelhante aos referidos autores, pois, para o referido membro
dos Annales, o historiador deveria recortar na miríade de informações do
passado aquilo que gostaria de abordar e aplicar o seu método investigativo,
haja vista a multiplicidade de informações históricas que detemos (BLOCH, 2002:
52). A perspectiva de Bloch, De Certeau, Howell e Prevenier nos leva a
constatar que a História é um processo que lida, não somente, com os eventos do
passado, mas, principalmente, com as escolhas e os interesses dos profissionais
que pretendem investigá-lo. Também é correto afirmarmos que a pesquisa histórica
lida com a afinidade que desenvolvemos com uma dada temática, entretanto,
inúmeras outras variáveis se fazem presentes na produção do conhecimento
historiográfico e na escolha de nosso tema de pesquisa. Dentre elas podemos
destacar o contexto histórico, o lugar
social, a nossa formação enquanto sujeitos, bem como as possibilidades documentais.
Elementos esses que devem ser levados em consideração pelos professores ao
dissertarem sobre um tema em sua prática de Ensino de História.
Imersos nessa ótica de pesquisa histórica, demarcamos
que foram tais variantes que nos levaram a Esparta, enquanto objeto de estudo.
De imediato, a sociedade espartana nos chamou a atenção pela maneira
simplificada com a qual era apresentada por alguns especialistas. Por
conseguinte, Esparta era representada como
um contraponto a Atenas, esta última tida como o bastião da cultura, da
política e da filosofia do Ocidente Moderno. Ora, com tantas sociedades
integrando a nossa concepção de Antiguidade, somente a ateniense serviu para
edificar os interesses, os valores e as tradições ditas ocidentais? De fato que
não. Munidos do breve debate estabelecido nos parágrafos anteriores, também nos
questionamos se isso não foi uma construção, e caso a resposta seja positiva, quando
isso teria sido iniciado? Estas indagações foram algumas das que nos motivaram
a investigar sobre a pólis de
Esparta, afinal, como esta sociedade teria sido tão “inferior” a Atenas, se a
mesma derrotou esta última na Guerra do Peloponeso?
A tendência com a qual nos deparamos no início
de nossas pesquisas foram desenvolvidas em uma tendência historiográfica de
cunho atenocêntrico, isto é, um viés
investigativo assimétrico que considerou outras póleis da Antiguidade a partir das práticas político-culturais de
Atenas. Podemos identificar esta inclinação entre os indícios literários do
Período Clássico, sobretudo, entre os autores que escreveram imersos no
contexto do conflito entre peloponésios e atenienses. Como via de exemplo,
Tucídides e Eurípides poderiam ser tomados como referenciais para essa
perspectiva, onde o lugar social que
ocupavam no interior da sociedade ateniense influenciou diretamente na maneira
como representaram Esparta.
Contudo, ainda que possamos verificar a
tendência adotada por estes pensadores antigos – ao relacionarmos os seus
respectivos discursos ao período histórico em que viveram – a historiografia
contemporânea, em inúmeras ocasiões, se utilizou deste comportamento polarizado
para tecer as suas análises acadêmicas. Podemos citar Moses Finley (Grécia Primitiva, 1990), Geoffrey De Ste
Croix (The Helot Threat, 2002) e
Jean-Pierre Vernant (O Homem Grego,
1994), cujos trabalhos consideraram a pólis
espartana como rústica, atrasada e culturalmente estagnada. Todavia, quando
situamos estes historiadores em seus respectivos contextos sociais, podemos
notar parte da motivação dos mesmos em tomarem Esparta como um algoz do ideal
de liberdade promovido pela democracia ateniense e, por vezes, apropriado pelo
Ocidente moderno. Desse modo para compreendermos tal assertiva, iniciaremos as
nossas considerações para que, por fim, sejamos capazes de perceber os fatores
que levaram Atenas a se constituir como modelo para as sociedades ocidentais,
enquanto Esparta foi relegada ao segundo plano dos estudos acadêmicos, até a
década de 1980. Sendo assim, lançaremos o nosso olhar ao século XIX e o início
do XX para percebermos as motivações dos pensadores em disforizarem1 a pólis
de Esparta em suas representações2.
Como havíamos demonstrado em outra ocasião
(ASSUMPÇÃO, 2014: 66-72), na Europa do século XVIII, a representação de Esparta idealizada por Plutarco ocupou um lugar
proeminente entre os eruditos franceses. Na obra intitulada “Vida de Licurgo”, o autor beócio
construiu uma imagem da sociedade espartana que beirava a utopia, onde o mítico
legislador Licurgo agia em benefício de todos os cidadãos, promovia a igualdade
política entre os homens, a divisão de bens materiais e o ideal da “bela morte”
em prol da pólis. Mediante estes indícios da documentação de Plutarco, a grande
maioria destes intelectuais da França moderna defendia que as práticas
culturais dessa pólis poderiam servir
de exemplo para a Europa do XVIII. Podemos citar os casos de Montesquieu (no Espírito das Leis, de 1748), Gabriel
Bonnot de Mably (Observações sobre os
Gregos, de 1749; Dos Direitos e dos
Deveres do Cidadão, escrito em 1758) e Jean-Jacques Rousseau (Do Contrato Social, de 1762), cujas
análises se utilizavam das sociedades da Antiguidade Clássica – sobretudo,
Esparta e Roma – como um instrumento de crítica ao Antigo Regime francês e o
seu despotismo.
No final do século XVIII, por sua vez, com o
desencadear da Revolução Francesa, a representação
euforizada3 da Esparta Clássica
sofreu algumas modificações. Nos dizeres de Paul Christesen, Maximilien de
Robespierre – um dos maiores expoentes da Revolução de 1789 – chegou a elogiar
a pólis espartana como um modelo de
“comunidade de bens”. Entretanto, após o período histórico conhecido como o
Terror, os opositores de Robespierre passaram a criticar as práticas
político-culturais dos cidadãos de Esparta (esparciatas),
como um instrumento para contestar a realidade da França, posteriormente a 1789
(CHRISTESEN, 2012: 181, 184). Ademais, Elizabeth Rawson amplia tais
considerações ao destacar que passada a Revolução de Independência
Norte-Americana e concomitantemente a Revolução Francesa, grande parte das
sociedades europeias concluíram que um governo republicano poderia ser empregado
em larga escala na modernidade. Desse modo, a liberdade política dos atenienses
do século V a.C., somada ao seu desenvolvimento artístico e à “disciplina
igualitária” de seus exércitos foram elementos identificados como adequados à
nova realidade da sociedade francesa entre o final do XVIII e início do XIX
(RAWSON, 1969: 270). Mediante o apresentado, observamos que parte dos valores
políticos, sociais, econômicos e militares da pólis de Esparta, manifestados pelo discurso de Plutarco, seria
adequado ao pensamento dos opositores do Antigo Regime e à sua típica
opulência. No entanto, com o advento dos excessos revolucionários, os seus
opositores tomaram a liberdade promovida pela democracia de Atenas como um
referencial para a edificação de um governo republicano, tornando Esparta e seu
modelo monárquico um exemplo inadequado aos intelectuais franceses do XIX.
Já nos “oitocentos”, figuras emblemáticas na
França e Inglaterra teceram críticas ainda mordazes ao comportamento espartano
na Antiguidade, promovendo elogios às práticas político-econômicas de Atenas.
No caso francês temos Numa Denis Fustel de Coulanges, o qual era diretamente
contrário aos ideais revolucionários da França, sobretudo à figura de
Jean-Jacques Rousseau. Logo, toda a repulsa que Fustel de Coulanges manifestou
ao representar Esparta esteve
diretamente associada ao pensamento de Rousseau (CHISTESEN, 2012: 192; HARTOG,
2003: 44-46)4. Como nos esclareceu Oswyn Murray, no Reino Unido
temos o caso do célebre político Edward Bulwer Lytton que, em seu “Athens – its Rise and Fall” (1837),
reprovou a conduta dos esparciatas.
Para Lytton os cidadãos de Esparta agiriam por conta própria, sem respeitarem
as determinações do governo, e estavam submetidos a atividades “obscuras”, cuja
intenção seria manter a sua tradição e bases econômicas fundamentadas na
escravidão (MURRAY, 2002: 383-384). Ampliando as considerações de Murray, Ian
Macgregor Morris (2004: 347) pontuou que os intelectuais franceses e ingleses
do XIX, defendiam que a “inércia” política e comercial de Esparta, aliada à
forma como os esparciatas tratavam os
seus escravos (hilotas) seriam
indícios suficientes para ressaltar que esta pólis era rústica e não correspondia ao modelo de sociedade que se
almejava construir na Europa Moderna.
Em contrapartida, grande parte destes pensadores
europeus passou a defender que os atenienses da Antiguidade puderam alcançar um
amplo poder e autoridade junto às demais regiões do Mar Egeu por meio do
aprimoramento marítimo e comercial, bem como através da liberdade que detinham
para pensar e deliberar sobre as suas questões políticas. Sendo assim, podemos
declarar que o contexto político-social da Europa no século XIX, o qual se
mantinha imerso no desenvolvimento industrial, na prática do imperialismo e no
combate ao Antigo Regime, levou os intelectuais franceses e ingleses a
considerarem Atenas como um exemplo do passado, cujas práticas
político-econômicas poderiam justificar as ações que a Europa promovia em
outras áreas do globo.
Devemos relembrar que o exemplo apresentado
concerne ao caso britânico e francês, isto significa que não podemos
generalizá-lo a toda a Europa. Nas sociedades de matriz germânica, por exemplo,
a representação de Esparta seguiu um
ideal de euforização, voltado ao
enaltecimento dos valores e práticas nacionais. Nos dizeres de Volker Losemann,
no início do XIX, Karl Otfried Müller produziu a obra “Os Dórios” (1820), cuja escrita romântica influenciou o pensamento
germânico da época e o modo como estes representavam
a sociedade de Esparta (LOSEMANN, 2012: 254-255). Em suas análises, Müller
demonstrou que os esparciatas
descendiam dos dórios, sendo estes representados
como o coração e a alma do mundo helênico. Losemann complementa e enfatiza que
a imagem difundida por Müller sobre a pólis
de Esparta estava carregada de elementos antidemocráticos, e refletia a
preocupação do autor com as guerras de libertação que a Prússia travava com
Napoleão I. Desta maneira, Esparta passou a ser vista como o arquétipo da
estrutura hierárquica e da organização militar do reino prussiano. Losemann
continua e destaca que foram nos escritos de Müller que a ideia de uma relação
“primordial” entre os gregos antigos e o povo germânico foi estabelecida,
levando a comparações entre a antiga pólis
de Esparta e a Prússia Moderna. Por fim, Losemann expôs que a concepção de uma
minoria de esparciatas que
controlavam um amplo contingente de populacional hilota, acabou fascinando os germânicos modernos fazendo com que os
valores da Antiguidade espartana se tornassem atuais para a realidade
político-social da Prússia no século XIX (LOSEMANN, 2012: 253-255).
Conjeturando a partir de Losemann (2012),
notamos que o amor por seu território, sua sociedade e o sacrifício em prol de
seu governante foram elementos que permearam o ideário dos guerreiros da
Prússia, com base nas representações
da pólis de Esparta. Nesse contexto,
as práticas culturais dos esparciatas
também foram elementos dos quais os intelectuais germânicos se utilizaram para
fomentar os seus valores e consolidar a sua “tradição esparto-prussiana”.
Com a consolidação da Alemanha, como Estado
(1871), e a implementação do Império Alemão (ou Germânico) chefiado pelo Reino
da Prússia, as representações dos
valores esparciatas acabaram se
difundindo por toda a área de influência imperial, o que não pressupunha a
adesão de todos os seus membros. Após a Primeira Guerra Mundial e a instituição
da República de Weimar, Esparta permaneceu no pensamento de parte dos
intelectuais alemães, os quais continuaram apropriando-se das representações das práticas político-culturais
espartanas.
Quando o partido nazista chegou ao poder na
Alemanha, notamos a presença de parte das ideias defendidas pelos intelectuais
de matriz germânica do século XIX e por aqueles que vivenciaram a emergência do
Império Alemão e sua subsequente derrocada, fazendo com que os discursos sobre
a superioridade germânica motivassem a tomada de novas decisões políticas após
a Primeira Guerra Mundial. Dialogando com Volker Losemann, ao relacionarem a
matriz cultural dos antigos helênicos com a dos germânicos, os nazistas
passaram a construir uma base identitária – política, social e étnica – entre
os seus membros, o que possibilitava a ratificação de todo um conjunto de
práticas sociais (LOSEMANN, 2012: 273).
Volker Losemann expôs que o modelo de conduta esparciata foi um exemplo de estrutura
antiga que os nazistas se apropriaram e ressignificaram para sua implantação na
Europa Oriental. Desse modo, Hitler teria se remetido a Roma e Esparta por
essas sociedades fornecerem a “condição arcaica para a unidade racial, com base
em uma sociedade agrária” (LOSEMANN, 2012: 273). Interagindo com Jacqueline
Christien e Yohann Le Tallec, Hitler teria grande fascinação pelos escritos e
pela tradição da Antiguidade Greco-Romana, onde a instrumentalização de valores
e práticas espartanas esteve atrelada ao seu interesse particular, mas também a
toda carga cultural advinda dos ideais filo-helênicos da Prússia de Frederico
II (CHRISTIEN; LE TALLEC, 2013: 246-247). Retomando Losemann, percebemos que os
ideais de Adolf Hitler tiveram o suporte de Richard Darré, cuja perspectiva
política defendia que assim como os esparciatas,
os alemães deveriam preservar a sua raça, os seus corpos e a sua terra
(ancestral). Entretanto, o ministro da Educação de Hitler, Bernhard Rust, teria
desenvolvido um programa educacional baseado nas práticas culturais dos esparciatas,
por volta de 1933, no qual aqueles que não quisessem integrá-lo não deveriam
ser reconhecidos como cidadãos alemães (LOSEMANN, 2012: 285). Helen Roche
complementa e explicita o argumento de Volker Losemann, pois, segundo a autora
esse programa educacional – denominado Nationalpolitische
Erziehungsanstalten (Institutos Nacionais de Educação Política) – foi
fundado por Bernhard Rust, como um presente de aniversário para o Führer, tendo como objetivo formar a
futura geração de líderes do Terceiro Reich. Nas palavras de Roche a seleção
para este instituto de educação era extremamente rigorosa, haja vista que
somente aqueles de descendência ariana, dotados de um caráter inquestionável,
com uma saúde racial pura, plena habilidade física e uma alta capacidade
intelectual poderiam ser eleitos para estas escolas (ROCHE, 2013: 180-181).
Roche ainda definiu que a pedagogia nazista interpretava a história de acordo
com os seus princípios políticos, incutindo nos jovens o pensamento de que a
vida era feita de conflitos, nos quais a raça, o sangue e a terra eram
essenciais para que os objetivos do Estado fossem realizados (ROCHE, 2012:
321).
Desta maneira, em 1941, a política de dominação
nazista ampliou-se após o ataque à União Soviética, quando os adeptos do
nazismo passaram a defender a ideia de que – assim como os esparciatas – os alemães deveriam formar um pequeno grupo aristocrático governando muitos
escravos, devido à sua natureza conquistadora. Finalmente, em 06 de fevereiro
de 1945, quando a derrota alemã era eminente, Hitler discursou ressaltando o
exemplo dos guerreiros esparciatas
nas Termópilas. Tais combatentes, mesmo sabendo do destino que lhes aguardava,
morreram pelo bem-estar e pelos ideais da pólis.
Losemann nos chamou a atenção para o fato de que, após a Segunda Guerra
Mundial, somente em 1983 apareceram novos estudos sobre Esparta, entre os
intelectuais alemães (LOSEMANN, 2012: 291-298).
Estendendo as considerações de Volker Losemann,
Stephen Hodkinson (2006: 112-113) afirmou que devido ao contexto da Segunda
Guerra Mundial e à apropriação das representações
de Esparta pelo partido nazista, a imagem dos esparciatas como membros de uma sociedade estritamente belicosa acabou
sendo difundida na historiografia do século XX. Imersos nesse viés, tornou-se
comum entre os pensadores socialistas e liberais do Reino Unido representar a Grã-Bretanha como o
equivalente à Atenas democrática, enquanto a Alemanha se aproximaria dos ideais
de Esparta, pensamento este que influenciou os escritos historiográficos na
Europa pós-guerra.
Tomando como referencial o exposto, podemos
concluir que a sociedade de Esparta da qual temos conhecimento foi o resultado
de inúmeros processos de apropriações e ressignificações discursivas, os quais
tomaram por base os escritos da Antiguidade. Com isso, a sociedade espartana
que se encontra presente nos livros didáticos, destinados ao ensino fundamental
e médio brasileiros5 manteve-se
alinhada aos rumos do Ocidente após a Segunda Guerra Mundial. Logo, a representação de uma pólis brutal, rústica e estagnada visava
corresponder aos interesses das potências europeias que se saíram vitoriosas
contra o nazismo alemão.
Ao retomarmos as figuras de Moses Finley,
Geoffrey De Ste Croix e Jean-Pierre Vernant, todos estiveram inseridos no
contexto da Segunda Guerra e atuaram em posições opostas à Alemanha, tornando
plausível a adoção que estes fizeram de um ideal “atenocêntrico” em seus
escritos historiográficos. Sendo assim, a lógica de uma História Tradicional e
dos vencedores – típica do século XIX – ainda se faz presente no nosso modelo
de ensino, cuja matriz remonta os interesses político-econômicos da França e da
Inglaterra dos “oitocentos” e a representação
germânica que se cunhou de Esparta. Seguindo essa ótica, a historicização
dos temas de abordagem historiográfica clarificam os rumos tomados pela
disciplina de História, enfatizando as influências dos eventos contemporâneos
no ordenamento do passado.
Notas
1.A disforização seria a atitude
de desqualificar práticas políticas, culturais e sociais de um dado grupo de
sujeitos (GREIMAS; COURTÉS, 1987: 130).
2. Ao tomarmos os pressupostos teóricos
de Pierre Bourdieu podemos definir a representação como uma imagem
construída de grupos e práticas sociais, bem como de objetos, no intuito de
interpretar/explicar as ações desempenhadas em uma dada sociedade. Logo, as representações
desenvolvidas em um meio social objetivam corresponder aos interesses dos
segmentos que as elaboraram (BOURDIEU, 2009:46). Desta maneira, nos convém
destacar que este conceito será aplicado em nossa abordagem no decorrer deste
artigo.
3. Nos dizeres de Algirdas Greimas e
Joseph Courtés, o ato de euforizar visa à valorização positiva de um sujeito
ou objeto de interesse, com ênfase à exaltação discursiva (GREIMAS; COURTÉS,
1987: 170).
4. O discurso de Numa Denis
Fustel de Coulanges é emblemático à medida que tenta desconstruir a representação
euforizada de Esparta. Dentre os seus argumentos temos uma oposição à
ideia de divisão igualitária de terras, bem como a tentativa de demonstrar que
Licurgo não detinha nada de único frente a outros legisladores antigos, e o
fato da maneira rústica com a qual os cidadãos espartanos tratavam os segmentos
sociais à margem da Lacedemônia (COULANGES, 2013, passim). Com isso,
verificamos que a perspectiva de Coulanges poderia ser identificada como o
oposto daquilo que Rousseau tentou propagar no século XVIII, na França.
5. Podemos citar o exemplo do livro “História:
sociedade & cidadania”, elaborado por Alfredo Boulos Júnior e publicado
pela editora FTD, no ano de 2012. Nesta ocasião, o livro do 6º Ano apresenta
apenas duas páginas sobre a pólis de Esparta e adota uma perspectiva
comparada com a intenção de diferenciá-la de Atenas. O viés empregado é
eminentemente “atenocêntrico” e caracterizou Esparta como uma sociedade
belicosa e oligárquica (BOULOS JÚNIOR, 2012: 212-213). Já o livro organizado
por Ronaldo Vainfas (et. al.) segue uma premissa distinta, embora o resultado
seja aparentemente idêntico à obra anterior. No trabalho intitulado “História:
das sociedades sem Estado às monarquias absolutistas”, os responsáveis
chegaram a priorizar uma interpretação relativamente renovada sobre Esparta,
porém, ao analisarem os hilotas (escravos) os autores primaram por uma
via tradicional e “atenocêntrica”, típica dos escritos de Tucídides, além de
comentarem que a educação dos jovens em Esparta valorizava apenas as questões
guerreiras (VAINFAS (et. al.), 2010: 62-64).
Referências
ASSUMPÇÃO, Luis Filipe Bantim de. Discurso e Representação sobre as práticas
rituais dos esparciatas e
dos seus basileus na
Lacedemônia, do século V a.C.. Dissertação
apresentada, como requisito para a obtenção do título de Mestre, ao Programa de
Pós-Graduação em História, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, 2014.
BLOCH, Marc. Apologia da história, ou, O ofício de historiador. Trad.: André
Telles. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.
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Caro Luis,
ResponderExcluirparabéns por seu texto! Você entende que hoje há uma releitura [ou, uma reconstrução] estereotipada do Espartano [como feita no filme '300'] dentro de um novo tipo de discurso ideológico? [militarista, ocidentalista, etc?]
saudações!
André Bueno
Olá André,
ExcluirFico lisonjeado pelo seu elogio e agradeço pela oportunidade. Quanto a apropriação da imagem de Esparta e do "ser espartano" eu, particularmente, não acredito que seja algo novo, afinal, o que pude perceber ao longo de minhas pesquisas é a reconstrução - tal como você citou - de um discurso ideológico já existente, mas servindo a propósitos distintos dos de outrora. Logo, podemos definir que todas as representações modernas de Esparta serviram aos interesses específicos do Ocidente, onde o militarismo integrou essa imagem.
Saudações!
Luis Filipe Bantim de Assumpção
as Civilizações Antigas mencionadas foi (ou ainda é) uma alusão feita por historiadores acerca dos acontecimentos politicos, sociais e economicos do pós-guerra?
ResponderExcluirRogerio Santos da Silva
Estimado Rogério,
ExcluirPosso afirmar que a apropriação de Esparta com um interesse de cunho político e econômico já na Europa do século XVIII. Logo, não seria adequado limitarmos essa perspectiva somente ao pós-Segunda Guerra, ainda que esse período seja a culminância de um longo processo, cujos efeitos presenciamos na maneira como essa Antiguidade Grega tem sido ensinada em nossas escolas.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
a impressão de que o modelo espartano foi efetivo pelo menos no caso alemão na forma como enxergavam um ideal de identidade, está de alguma maneira presente no que se refere ao periodo de Hitler?
ResponderExcluirRogerio Santos da Silva
Estimado Rogério,
ExcluirDe fato, a ideia de um modelo de cidadão e guerreiro nos moldes espartanos, tal como verificamos na "Vida de Licurgo" da autoria de Plutarco, foi empregada na tentativa de se formar os jovens alemães em concomitância a esse processo e servindo aos interesses do Estado nazista. Entretanto, esse posicionamento e apropriação de um dito "modelo espartano" já se fazia presente na Prússia do século XIX, onde os escritos de Karl Müller contribuíram bastante para essa visão.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Em que medida a hermenêutica formal, de determinada vertente historiográfica, cuja exegese acerca do Outro se faz a partir de um liminar discursivo de ruptura, ou seja, o Outro enquanto ininteligível em sua plenitude e, por conseguinte inapreensível, exclui as perspectivas multiculturais, ao mesmo tempo em que privilegiam, ao cristalizar e encerrar os modos de compreensão e interpretação a um eurocentrismo hermético?
ResponderExcluirRafael Watanabe
Estimado Rafael,
ExcluirAcredito que essa pergunta seja imensamente específica quanto a tendências historiográficas e filosóficas que lidam com questões de signo e a maneira como este nos permite comparar, perceber e representar o "outro". Contudo, devemos considerar que, independentemente do período, ao adotarmos um conjunto de signos e símbolos, de tal maneira que sejam introjetados em um grupo e/ou sociedade, somos capazes de cristalizar a interpretação dos sujeitos em conformidade aos nossos interesses, tal como a perspectiva eurocêntrica.
Espero que a resposta tenha sido adequada.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Evidentemente podemos depreender, desde os aspectos simbólicos – como a adoção da águia enquanto símbolo nacional – culminando no postulado pragmático de que “um pequeno grupo deve governar devido à sua natureza conquistadora” nos fornece um modelo de estudo comparativo para pensarmos a história alemã hitleriana e a sociedade hodierna norte americana cujos aspectos assinalam, assim como na Alemanha nazista, tendencias totalitárias?
ResponderExcluirRafael Watanabe
Estimado Rafael,
ExcluirAcredito que o seu posicionamento não seja inviável, no entanto, a perspectiva por você citada se enquadraria na lógica romana. Todavia, não seria incorreto pensarmos essa interação entre a política de "dominação" nazista e a norte-americana de hoje em conformidade a uma ideia de "herança cultural" do Ocidente. Sendo assim, o ideal romano poderia ser empregado conforme o interesse e a necessidade das sociedades ocidentais sem que para isso partilhem da mesma perspectiva política.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Bom Dia Prof.Luis!
ResponderExcluir-Achei seu texto muito pertinente pois mostra bem como os historiadores e aqueles que interpretam seus estudos podem manipular para seus interesses.
-Gostaria que informasse um bom livro para conhecermos mais sobre a sociedade espartana e que seja baseado em fatos e pesquisas e não suposições?
-Existe algum livro em portugues que mostre essa proximidade entre o Nazismo e a manipulação dos estudos sobre Esparta nesse viés militarista?
Desde já Grato,
Alfredo Coleraus Sommer
Estimado Alfredo,
ExcluirAgradeço pelo seu elogio, no entanto, eu não saberia informar nenhum texto em português que versasse sobre a temática. Caso tenha o interesse veja os autores da minha bibliografia, a grande maioria tem perfil no "academia.edu" e disponibilizam artigos recorrentemente. Do mesmo modo, você pode acessar o site da "rede sirius" (biblioteca da UERJ) e procurar a minha dissertação de mestrado.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Através de que recursos didáticos e/ou metodológicos podemos despertar nos alunos essa percepção da história como construção do presente acerca do passado? Como instrumentá-los criticamente nessa questão, de modo a fazê-los perceber os usos da história no presente, especialmente pela mídia/internet? E seus objetivos.
ResponderExcluirAllan Themístocles Galdino Ferreira
Estimado Allan,
ExcluirNão existe um modelo básico de quesitos didáticos e metodológicos, ao meu ver, que suscitem o interesse dos alunos. Entretanto, o que você pode tentar buscar são os "usos do passado", enfatizando que a História - enquanto Ciência e disciplina - se elabora através dos questionamentos atuais que lançamos ao passado, geralmente, na tentativa de respondermos aos nossos anseios como historiadores. Talvez auxilie neste processo se você se utilizar de ferramentas mais modernas, como filmes, jogos e HQs tentando contextualiza-los, ressaltando a intencionalidade discursiva de cada meio.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Olá, Felipe,
ResponderExcluirGrande parte da documentação antiga sobre Esparta foi produzida através da visão dos atenienses, que não economizaram em suas críticas e essa é geralmente a visão repassada nos livros didáticos e nas escolas. Existe outras documentações que não passaram por esse filtro para se estudar a sociedade espartana?
Abraços,
Jhan Lima
Estimado Jhan,
ExcluirEnquanto historiadores temos que nos utilizar do material que dispomos, porém, contextualizando as obras e os seus respectivos autores almejando a sua possível intencionalidade discursiva. Logo, a documentação ateniense teria "filtros" como qualquer outra. Em suma, todo documento detém algum tipo de interesse e parcialidade, seja ele proveniente de Atenas ou qualquer outra pólis. A problemática levantada por você lida com outras questões, tais como: o uso de Atenas como modelo de cultura ocidental; o fato desta sociedade manifestar práticas que foram valorizadas por potências político-econômicas a partir do final do XVIII; o emprego do discurso de Tucídides e/ou dos trágicos sem um olhar crítico. Enfim, se você busca documentos distintos procure Xenofonte (Helênica; Agesilau; Constituição dos Lacedemônios), pois embora seja imensamente parcial a Esparta acaba servindo de contraponto para uma representação atenocêntrica de parte das sociedade gregas.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Olá Professor Luis, interessante forma como o tema foi abordado. Toda e qualquer fonte é passível de manipulação, seja por quem a cria, seja por quem a interpreta, e não poderia ser diferente no caso da Grécia, onde praticamente tudo o que nos restou de documentos escritos veio de Atenas, principal rival de Esparta.
ResponderExcluirFoi mencionado ao longo do texto as visões existentes acerca de Atenas e Esparta desde o final do século XVIII, na França revolucionária, e do início do XIX, na Prússia invadida por Napoleão. O texto logo avança para o período da Primeira Guerra, e posteriormente para a visão Nazista de como utilizar o modelo militarista espartano. Nesse meio tempo, tivemos a guerra franco-prussiana, em meados da década de 70 do século XIX se não me falhe a memória, no qual a Alemanha conquista territórios franceses, desencadeando um nacionalismo exacerbado em ambos os países, usados como motivos para uma guerra iminente, que foi a Primeira Guerra. Nesse sentido, gostaria de saber se suas fontes de pesquisa indicam se nesse período a França manteve sua visão de Atenas, e a Alemanha de Esparta.
Outra pergunta que me surgiu, é que mencionastes que os estudos históricos sobre Esparta na Alemanha foram interrompidos do pós-guerra à década de 1980. Gostaria de saber como procederam as pesquisas de Esparta no restante do mundo, como Inglaterra, EUA ou outros, e se essas pesquisas sempre focassem no elemento militarista de Esparta, relacionando ou não com a Alemanha Nazista, ou também investigassem outras perspectivas dessa Pólis, como culturais e políticas.
Caio Yuzo Dias Nobushige ,Licenciando em História.
Estimado Caio,
ExcluirVamos por partes. Quando, no final do seu primeiro comentário, você afirmou que Esparta e Atenas eram rivais eu poderia sugerir que essa visão depende do momento histórico. Na verdade, grande parte dessa interpretação polarizada e excludente se desenvolveu na modernidade europeia. No que concerne a sua primeira pergunta, para uma parte significativa dos intelectuais franceses após a Revolução de 1789 e que valorizavam questões acerca de liberdade e propriedade privada, Esparta era um ideal abominável. Todavia, para a realidade da Prússia, a imagem de Esparta que empregavam defendia grande parte daquilo que almejavam, ou seja, o sujeito ser subtraído em prol da pólis, os guerreiros morrerem em benefício de seu governante e de seu território, mas sobretudo a questão da ordem e da disciplina que teria se iniciado na juventude dos espartanos. Com isso, Esparta se tornou um ideal que se refletia nas ações da Prússia e, dessa forma, deveria ser combatida em virtude da liberdade (atrelada a democracia de Atenas). Por isso, no pós-guerra Franco-prussiana uma parcela dos intelectuais franceses estavam mais propensos a se identificarem com Atenas. Para responder a sua segunda pergunta preciso esclarecer que as pesquisas desenvolvidas na Alemanha, a partir da década de 1980, teriam considerado Esparta pela sua especificidade, enquanto que o discurso característico do período tentava ressaltar o quanto os valores espartanos eram inadequados como algo semelhante aos ideais nazistas. Boa parte dos pesquisadores europeus e norte-americanos, devido aos efeitos do pós-segunda guerra, também representavam Esparta como algo que deveria ser evitado. Para verificar esta perspectiva, basta procurar pelos textos produzidos nesse período, onde uma das exceções mais célebres seria François Ollier. Moses Finley, Claude Mosse, Victor Ehrenberg, Chester Starr, entre outros, tomaram a sociedade espartana como algo terrível e, recorrentemente, produziam análises para endossar essa perspectiva e legitimar a supremacia ateniense no "mundo ocidental".
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Quais são os melhores ou mais renomados autores que trabalham com história de Esparta? E também, quais são os que melhor podem ser usados para preparar uma aula sobre o assunto? - João Gilberto Solano
ResponderExcluirEstimado Gilberto,
ResponderExcluirSe você está buscando manuais sobre o assunto, eu poderia te sugerir o Paul Cartledge com "Sparta and Lakonia", o Cesar Fornis em "Esparta– Historia, Sociedad y Cultura de un Mito Historiográfico", o Massimo Nafissi com "La Nascita del Kosmos – Studi sulla storia e la società di Sparta", Nigel Kennell em "The Spartans - A new history", Jacqueline Christien e Françoise Ruzé em "Sparte – Géographie, mythes et histoire", por fim, Ernst Baltrusch com "Sparta: Geschichte, Gesellschaft, Kultur". Todos os citados dão um panorama geral do desenvolvimento de Esparta do Período Arcaico ao Clássico (alguns até o Romano). Do mesmo modo, você pode procurar os meus textos na internet, pois, embora eu não tenha versado sobre todos os aspectos inerentes a sociedade espartana, eu cheguei a trabalhar com muitos dos autores citados.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Professor umas das tantas diferenças e características da sociedade espartana e da ateniense, é referente a participação das mulheres. Não seria um dos motivos pela escolha da valorização da sociedade ateniense, a falta de participação das mulheres? Justificando assim uma sociedade dominada por homens? Noeli Zettel
ResponderExcluirEstimada Noeli,
ExcluirAtravés de minhas pesquisas eu poderia afirmar que esta perspectiva é um tanto complexa, haja vista que as mulheres de Esparta não eram "livres" como muitos pensam. Temos que reconhecer que as mulheres espartanas legitimavam as práticas político-sociais de seus homens, mas, ainda assim, não seriam capazes de representar uma ordem social distante do universo masculino em que se encontravam. Logo, não consigo perceber esse uso da maneira polarizada como você sugeriu.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Professor umas das tantas diferenças e características da sociedade espartana e da ateniense, é referente a participação das mulheres. Não seria um dos motivos pela escolha da valorização da sociedade ateniense, a falta de participação das mulheres? Justificando assim uma sociedade dominada por homens? Noeli Zettel
ResponderExcluirProfessor umas das tantas diferenças e características da sociedade espartana e da ateniense, é referente a participação das mulheres. Não seria um dos motivos pela escolha da valorização da sociedade ateniense, a falta de participação das mulheres? Justificando assim uma sociedade dominada por homens? Noeli Zettel
ResponderExcluirÉ interessante perceber a manipulação do passado em prol da criação de um modelo, de uma identidade que valorize e apoie certos comportamentos contemporâneos. A crença numa raça superior justifica a apropriação do passado de povos que se sobressaíram, como a Grécia e o Egito. Até hoje há quem não saiba que o Egito fique no continente africano, pessoas ditas “estudadas” se espantam com a descoberta. Num mundo em que algumas pessoas ainda tem uma visão dicotômica da realidade, como fazê-las entender que vivemos num momento em que o multiculturalismo se faz cada vez mais presente?
ResponderExcluirDebora Shizue Matias Takano
Estimada Debora,
ExcluirAcredito que esse seja um processo em que nós, educadores/professores, devemos nos esforçar mais para promover. Com o multiculturalismo podemos empregar meios e informações, que outrora estariam distantes ao nosso acesso, para o enriquecimento de nosso trabalho. No entanto, partilho da ideia que discutir com o aluno a função e a viabilidade da História atualmente seja um grande desafio para os professores.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
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ResponderExcluirBom dia, excelente texto, Através de alguns teóricos que o senhor trouxe no texto, ficou explicito que o texto historiográfico parte do presente e, que este presente influencia sobremaneira nestas produções, assim como a formação e o local onde está inserido o historiador que realizara este trabalho. Pensando desta maneira a historiografia seria uma literatura baseada em documentos, selecionados e organizados pelo historiador, onde fica a verdade histórica?
ResponderExcluirErivaldo da Silva Pereira
Estimado Erivaldo,
ExcluirDe fato, existem historiadores que acreditam que o nosso ofício se insere na condição de texto literário, no entanto, outros partem da dicotomia clássica da Europa no XIX de que a História e a Literatura são áreas distintas, pois a primeira lida com a verdade enquanto a segunda seria o reflexo da capacidade inventiva de seu autor. A referida tendência é bastante debatida até os dias de hoje, haja vista que interagimos com uma parte muito pequena do passado e somos levados a exprimir a nossa habilidade enquanto "escritores" para tornar o nosso trabalho sedutor e digno de veracidade pelos pares e leitores. Nesse contexto, também verifico que o literato se encontra diretamente influenciado pelo seu próprio contexto histórico, fazendo do seu trabalho um dos mecanismos mais adequados para tentar se perceber as tendências culturais de uma época. Com isso, o nosso trabalho detém uma técnica muito semelhante aos textos literários, onde as nossas ideias são articuladas em conformidade a um documento literário, arqueológico, epigráfico, imagético de modo que possamos responder as nossas hipóteses. Logo, a verdade é relativa e o historiador há muito vem se distanciando da "verdade histórica" e buscando interagir com um princípio de verossimilhança. Acredito que você deveria ter cuidado com a "verdade histórica", afinal, levantamos hipóteses acerca de possíveis formas de se enxergar o passado, as quais estão atreladas ao nosso contexto histórico e lugar social de fala.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção
Olá Luis, gosto do seu trabalho principalmente porque ele discute a influência do historiador e do presente na história por meio de um caso específico e instigante, que é Esparta. Para isso, você recorreu a nomes de "peso", tais como Finley e Vernant, para demonstrar a relação entre a pólis e o século XX. Ainda que essas relações lamentavelmente não sejam com frequência levantadas pelos historiadores, perguntei-me ao longo da leitura, se não estaria construindo neste caso uma visão utilitarista para a história? Essa é a impressão que se tem ao ler o texto, ou seja, que os historiadores estavam, de fato, construindo visões de mundo com um propósito específico. Você defende essa ideia?
ResponderExcluirBeatriz Rodrigues
Estimada Beatriz,
ExcluirAcredito que não seria um problema classificar esta minha abordagem de utilitarista, contudo, me questiono quem dentre nós - historiadores - não se utiliza desta perspectiva? Afinal, a todo momento o nosso texto parece defender um objetivo específico, cujo utilitarismo pode estar associado as nossas escolhas, ao nosso lugar de fala, ao contexto histórico em que vivemos, etc. Em linhas gerais, o historiador é um formador de ideias, ao ponto de muitos alunos até hoje acreditarem que tudo dito pelo mesmo seria uma verdade, haja vista que o "passado é uma realidade inquestionável". Sendo assim, posso afirmar que defendo esse posicionamento, e que o mesmo é realizado até os dias de hoje.
Cordialmente,
Prof. Luis Filipe Bantim de Assumpção